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NAUFRÁGIOS

 
Revista Mergulho, ano II, Nº 11.
Texto: Maurício Carvalho Fotos:Ary Amarante
 
De norte a sul, não faltam excelentes opções para quem quer visitar navios afundados

Pelo menos 150 embarcações afundadas no Brasil são freqüentadas por mergulhadores. A informação é do SINAU (Sistema de Informação de Naufrágios), uma cooperativa de amantes do mar que iá registrou 1.100 naufrágios ao largo da nossa costa e cujo e-mail é [email protected] .Mas, afinal de contas, quais são os melhores para visitar? Depende do critério. Quem gosta de arqueologia, prefere os navios mais antigos. Só que quanto mais tempo uma embarcação fica no fundo do mar, maior o risco de entrar dentro dela. Os naufrágios mais novos são mais seguros. Mas costumam ter menos vida marinha.
Um bom critério para escolher naufrágio é o acesso fácil. Assim acontece com o Pingüino, em Angra dos Reis (RJ), com o Rosalina, em Abrolhos (BA), com o Pirapama, no Recife (PE), e com o Queimado, em João Pessoa (PB). Estes quatro naufrágios não são apenas fáceis de visitar Eles têm rica vida marinha e são diamante! cintilantes no tesoure de nosso mundo submarino. 0 bom mergulhador que se preza faz questão de ter pelo menos um deles em seu Log book.
Escolha o seu:

ROSALINA
O arquipélago de Abrolhos, no sul da Bahia, é famoso pela riqueza da vida marinha, pelas formações únicas de coral e pela visita de baleias-jubarte, que procuram suas águas para reproduzir e criar seus filhotes. Mas há mui-tos outros atrativos para os mergulhadores. Entre eles, os destroços do navio Rosalina, de 96,3 m de comprimento e 13,3 de largura, o ponto alto de qualquer visita ao arquipélago -- hoje Parque Nacional Marinho.
Segundo os arquivos do Tribunal Marítimo, este car-gueiro de bandeira panamenha chocou-se em 1939 con-tra os cabeços de coral de um parcel, indo a pique em poucas horas numa área de navegação complicada. Hoje, o Rosalina está totalmente integrado à fauna do arquipélago, a 2 milhas e meia ao leste de Santa Bárbara, a, principal ilha de Abrolhos. E facílimo chegar até o navio. Embora seja necessário navegar 33 milhas (61 km), a partir da barra de Caravelas.
A facilidade é tamanha que, na maré baixa, a ponta da proa do Rosalina aflora. Partindo dela, dá para nadar calmamente, passando pelos dois porões de proa, pelos mastros e paus-de-carga. A meia-nau, o casco rompeu-se, espalhando pelo fundo caldeiras, máquinas e outros componentes. Na popa, é possível ver a parte restante do cavername e a roda do leme. Estão a 20 metros de profundidade, junto ao hélice e ao leme.
Por todas as partes podem ser vistos grandes cabeços de coral-cérebro (Muscismillia brasiliiensis) e uma infinidade de peixes como garoupas e badejos. Não se assuste com o grande mero que freqüenta o pedaço e costuma passar longas temporadas na casa de máquinas. Apesar do tamanho -- ele pesa cerca de 250 quilos --, o bicho não faz mal a ninguém. Junto ao hélice também é comum topar com um farto cardume de salemas, sempre disposto a posar para os fotógrafos.
Para os que gostam de mergulhos mais técnicos, o Rosalina também reserva surpresas agradáveis. Logo no início da proa há uma passagem junto ao fundo que permite atravessar de um bordo ao outro por debaixo do cas-co do imenso navio -- que pesava 2.851 toneladas, quando na ativa. Já no convés a entrada dos três porões parece irresistível a qualquer mergulhador. O rompante de entrar, porém, deve ser refreado. Os porões estão repletos de sedimentos que podem turvar a água, caso alguém com menor controle de flutuabilidade perturbe o fundo onde os tais sedimentos descansam. Se você domina as técnicas de penetração, seu prêmio será a visão dos vários sacos de cimento que faziam parte da carga, arrumados e amarrados ainda como no dia em que o navio zarpou.
Águas claras e quentes são comuns, assim como uma constante corrente de média intensidade, que não chega a prejudicar a descida. Vale a pena lembrar que todo mergulho deve ser executado do fundo para o raso. Desse modo, ao cair na água, dirija-se diretamente para a popa, iniciando daí a exploração aos destroços do Rosalina em direção à superfície.

PIRAPAMA
Recife (PE) é a capital nordestina do mergulho em barcos afundados. Ao longo da costa podem ser visitados nada menos que 12 naufrágios. Entre as opções estão o Vapor de Baixo, a Chata de Noronha, o Reboque e até mesmo um avião, um B-19, da II Guerra Mundial. Em meio a tantas estrelas, o Pirapama consegue um lugar de destaque, a 6 milhas (11 km) do porto de Recife.
A incrível visibilidade da água e a farta quantidade de peixes coloridos, raias, tartarugas e outras formas de vida tornam este naufrágio um dos mais atraentes do litoral brasileiro. O Pirapama, no tanto, é a testemunha muda de uma tragédia.
No dia 24 de março de 1887, o navio chocou-se com o Vapor Bahia, que afundou imediatamente, causando diversas mortes. Jamais se conseguiu apurar o número exato dos tripulantes. Quanto ao Pirapama, ainda que bastante avariado, conseguiu retornar ao porto. Seu destino, todavia, já estava selado. Um ano depois do aci-dente e parcialmente desmontado, o vapor -- de estimados 60 m de comprimento e 8 de largura -- foi deliberadamente afundado.

Embora o casco esteja quase inteiro, poucas peças podem ser encontradas neste naufrágio. A rigor, é possível ver os grandes cilindros de oscilação que compunham as máquinas, os eixos das rodas de propulsão e outras peças menores. Quase nada além disso. Quem ler este relato pode ser levado a achar que mergulhar no Piraparna é desinteressante. Seria um julgamento precipitado. Atirados ao fundo de areia, os destroços servem como palco para um espetáculo de balé submarino com cores e movimentos dos milhares de peixes que habitam o naufrágio.
De outubro a maio, as águas quentes e claras dispensam o uso de roupa de mergulho e permitem vislumbrar o Pirapama já da superfície, apesar dos 23 m de profundidade. As operadoras locais amarram seus barcos diretamente no nau-frágio, o que facilita muito a descida e subida, mesmo em dias de correnteza forte.
Como a profundidade já permite tempos de fundo descompressivos, é recomendável recorrer a um computador de mergulho para melhor controlar a imersão.

Foto: Maurício Carvalho
QUEIMADO
O navio Erie era um belo exemplar de paquete. Além da propulsão a vapor, utilizava velas para aumentar a performance e diminuir os custos. No dia 2 de janeiro de 1873, quando retornava aos Estados Unidos com uma carga de 25 mil sacas de café, um violento incêndio consumiu o navio até a linha d'água, levando-o ao fundo. As chamas na noite escura eram tão violentas que chamaram a atenção dos pescadores de João Pessoa, a capital da Paraíba. Velejando até o navio, eles prestaram socorro aos sobreviventes e batizaram o naufrágio como "Queimado".
Hoje, o Erie ou Queimado, como é mais conhecido, pode ser atingido em pouco mais de 1 hora e meia de navegação, a partir da praia de Tambaú. Os destroços do navio -- que media estimados 100 m de comprimento e pesava 3.502 toneladas -- estão a uma profundidade de 9 m a 18 m, já totalmente desmontados. Eles espaIharam-se em um fundo plano e de fina areia branca. Entre as muitas peças grandes -- como hélices, máqui-nas e partes do casco --, as que mais sobressaem são as quatro avantajadas caldeiras. Além do tamanho graúdo, elas têm formas quadradas, o que é bastante raro.
Multas surpresas aguardam quem se aventura a mergulhar em João Pessoa. Entre elas, a enorme quantidade de peixes. Há cardu-mes de chirras tão grandes e densos que, por vezes, fica até difícil observar os destroços. É possível encontrar, ainda, diversos ciliares, raias e lambarús perambulando entre as peças.
O mergulho no Queimado não exige grande técnica. A água é quente, clara e a profundidade baixa, o que torna os mergulhos longos e muito agradáveis. Não há estruturas inteiras que permitam a penetração, mas o visual do naufrágio e a vida que ele agrega compensam. E valem a viagem até a Paraíba.

PINGUINO
Afinal de contas, o que aconteceu com o Pinguino no dia 24 de junho de 1967, quando o pequeno cargueiro afundou na enseada de Sítio Forte, na Ilha Grande, em Angra dos Reis (RJ). Passados quase 30 anos, ainda há algum mistério sobre o naufrágio. A companhia de navegação Lloyd Brasileiro, a quem supostamente mente o navio pertencia, não tem registros a respeito. Já a Capitania dos Portos de Angra dos Reis informa que o navio pediu autorização para atracar no porto da cidade mas esta solicitação lhe foi negada. O motivo: o Pinguino estava em chamas e colocaria em risco as demais embarcações do porto. De fato, havia cinco dias que o cargueiro de aço, com estimados 50 m de comprimento por 12 de largura, amargava um incêndio que vinha consumindo toda a sua carga, composta por toneladas de cera de carnaúba -- material altamente inflamável. Assim, sua tripulação não teve outra alternativa senão rumar para a enseada do Sítio Forte e abrir todas as válvulas. Vagarosamente, o Pinguino foi a pique. Não houve vítimas, embora ninguém saiba ao certo qual era o tamanho da sua tripulação.
Hoje, o Pinguino é um dos mais freqüentados naufrágios do país. Há muitos motivos para isso. O cargueiro afundou próximo da costa -- a apenas 7 milhas de Angra dos Reis -- em uma região de fácil acesso e com águas abrigadas. Como se não bastasse, o Pinguino está em uma área razoavelmente rasa e sua profundidade varia de 7 m a 20 m. Tamanha facilidade favoreceu aos "piratas" submarinos, que depenaram boa parte dos objetos de bordo. Foram surrupiadas vigias, âncoras, correntes e até mesmo os hélices. O casco, porém, continua praticamente inteiro, tombado de boreste, permitindo pequenas incursões ao seu interior.
O mergulho mais fácil e seguro, porém, é visitar apenas a área externa do navio, onde podem ser vistos os paus de carga, guinchos, o casario, as entradas de porão e os lemes. Os iniciantes devem se limitar a esta visita menos invasiva. Quem aprendeu técnicas de penetração em algum curso de mergulho em naufrágio terá boas opções a partir do rombo na lateral do casco em direção aos porões de proa e popa. No entanto, é importante lembrar que o Pinguino começa a entrar em sua fase de desmonte, o que aumenta muito o risco de acidentes. O mais prudente, portanto, é limitar seus mergulhos ao exterior do navio.
Quanto às águas da enseada do Sítio Forte, elas nem sempre são claras e quentes. Mesmo assim, o Pinguino é um ponto de mergulho que não pode faltar no seu Log book.

 

NAUFRÁGIOS

Pinguino
Ano do afundamento: 1967
Localização: enseada do Sítio Forte, Ilha Grande, RJ.
Motivo do afundamento: incêndio.
Profundidade: 7 a 20 metros
Condições atuais: inteiro
Nacionalidade: informação não disponível
Tipo de embarcação: graneleiro/diesel
Carga: cera de carnaúba
Rosalina
Ano do afundamento: 1939
Localização: Parcel dos Abrolhos, Abrolhos, BA.
Motivo do afundamento: bateu nos recifes
Profundidade: 0 a 20 metros
Condições atuais: inteiro
Nacionalidade: panamenha
Tipo de embarcação: cargueiro/vapor
Carga: cimento e cerveja
 
Pirapama
Ano do afundamento: 1889
Localização: entre Recife e Olinda, PE.
Motivo do afundamento: chocou-se com o Vapor Bahia
Profundidade: 19 a 23 metros
Condições atuais: semi-inteiro/ desmantelado
Nacionalidade: brasileira
Tipo de embarcação: vapor de rodas
Carga: não há

Erie (Queimado)
Ano do afundamento: 1873
Localização: Praia de Tambaú, João Pessoa, PB.
Motivo do afundamento: Incêndio
Profundidade: 9 a 18 metros
Condições: desmantelado
Nacionalidade: americana
Tipo de embarcação: cargueiro/vapor
Carga: café
 

 
Obs: Na matéria constam outras fotos
 

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