Destino: naufrágio

ATENÇÃO com a FAUNA !


 
Revista Mergulho, Ano XII - Nº 146 - Setembro/2008
Texto: Maurício Carvalho
 
Nos últimos anos tenho me dedicado tanto aos naufrágios que até o "boato maldoso" de que odeio peixes, (porque prejudicam a visão dos naufrágios...) foi espalhada por amigos brincalhões.
Mas mesmo mergulhadores próximos não sabem que, por formação e profissão, sou biólogo marinho. Portanto, não poderia de forma alguma abandonar a fauna marinha típica dos naufrágios nesta seqüência de artigos.

RECIFES ARTIFICIAIS
Sem dúvida, o aspecto mais relevante da presença de um naufrágio no fundo do mar é seu incremento a fauna marinha. A proteção desses destroços contra a passagem de redes de arrasto e o substrato duro para a agregação

 
de vida, são dois dos elementos que justificam, para a maioria dos biólogos, a colocação no fundo de recifes artificiais. 
Um naufrágio porém também provoca impacto ambiental. Ao afundar, o navio leva consigo uma série de substâncias potencialmente poluentes que compõem a estrutura do navio, como: fibra de vidro e amianto do isolamento térmico, chumbo e outros metais, petróleo e derivados utilizados nas máquinas. Além, naturalmente, da própria carga, como cimento, defensivos agrícolas ou gás, só para citar alguns.
mas passado o devido tempo para o reparo ambiental, até mesmo um naufrágio fruto de acidente, que não passou pela limpeza criteriosa dos projetos de Recifes Artificiais, pode começar a produzir ganhos para o meio ambiente.

 

NAUFRÁGIOS SÃO UM DOS SUBSTRATOS DE MAIOR AGREGAÇÃO BIOLÓGICA
Quando analisamos um costão típico de nosso litoral, percebemos que ele é bidimensional, isto é; permite que a fauna incrustante se instale em uma camada aderida.
Já os naufrágios, funcionam como recifes de coral, aderindo organismos em uma camada, mas também, criando um ambiente tridimensional, com centenas de nichos específicos que podem servir de abrigo para uma enormidade de espécies marinhas.

 
 

O QUE O MERGULHADOR DE NAUFRÁGIO TEM COM ISSO ?
Aspectos da técnica de naufrágio, como localização, orientação, pesquisa e segurança podem ser deduzidos por um mergulhador com olhos treinados, ao identificar características específicas da fauna marinha.

DATANDO O NAUFRÁGIO
Muitas vezes precisamos datar um naufrágio para tentar fazer sua identificação. Neste caso, podemos lançar mão do crescimento de corais, briozoários entre outros organismos incrustantes.
As taxas de crescimento de corais, embora variem de um local para o outro, são quase uma constante ao longo dos anos, e podem ser medidas e obtidas com os pesquisadores locais. Com ela, podemos calcular aproximadamente a quanto tempo o navio está afundado.

 

LOCALIZANDO O NAUFRÁGIO
Ao longo dos anos, na busca por naufrágios, diversas vezes cheguei ao fundo e só encontrei areia, - destroços, nada! Algumas vezes, ao observar o fundo, pude observar cardumes passando em uma direção específica. Nestes casos, é quase certo que esses peixes estejam indo ou voltando para o navio.
Se você conhece a espécie de peixe e sabe se seu período de atividade é diurno ou noturno, poderá saber se eles vão ou voltam do navio. Tartarugas também podem indicar a posição de destroços, pois quando freqüentam o local, emergem com regularidade para respirar na mesma posição.

 
 
 ORIENTAÇÃO
Principalmente em águas escuras, é comum chegar ao fundo sem saber exatamente onde estamos. Nestas ocasiões, a fauna pode dar importantes dicas.
Gorgônias, são animais filtradores, e as que atingem grandes dimensões estão freqüentemente no lado de fora do casco, em áreas abertas e sujeitas a correntes.
Numa condição oposta estão os Cirianthus, essa espécie de anêmona tubular está normalmente alojada em áreas abrigadas de fortes correntes, indicando, ao mergulhador que chega ao fundo, o interior do casco.
 
 

 
SEGURANÇA
O naufrágio reúne um grupo de organismos muito variado e alguns desses podem causar ferimentos a um mergulhador descuidado:
 

ANIMAIS INCRUSTANTES
As peças de um naufrágio estão normalmente totalmente cobertas por animais aderidos, o que torna a superfície muito irregular.
Durante a passagem da carretilha, evite fixar o cabo-guia por muitas voltas ou mesmo utilizar a laçada clássica de cabos de cavernas, pois você terá a desagradável surpresa de não conseguir soltar com facilidade o cabo no retorno ao exterior.

ANIMAIS QUE CORTAM
Presos ao naufrágio existem muitos organismos com superfícies afiadas como: corais, esponjas calcáreas e moluscos; eles podem cortar a roupa de mergulho ou mesmo a

 
pele de um mergulhador. O contato do ferimento com a matéria orgânica desses organismos provoca fortes inflamações.

 

ANIMAIS QUE FURAM
Organismos providos de espinhos, ouriços-do-mar e peixes-pedra, são ainda mais perigosos. Os ouriços como possuem espinhos internos, causam uma forte reação quando perfuram a pele humana. No caso dos peixes da família Scorpaenidae (peixes escorpiões) como os Peixes-pedra, Mangangás, Nikins, os espinhos da nadadeira dorsal são capazes de inocular forte substância tóxica.
Para proteger-se desses animais o fundamental é possuir um bom equilíbrio hidrostático e evitar apoiar-se nas peças do fundo.
 

 ANIMAIS QUE MORDEM
Muitos animais utilizam os destroços como moradia. Mergulhadores mais afoitos podem introduzir a mão inadvertidamente em um dos milhares de buracos que se formam entre as peças e, que servem como abrigo para esses organismos e acabar sendo mordidos por moréias, polvos e outros animais. Todos eles possuem na boca, além de dentes afiados e bicos córneos, bactérias que com certeza irão infeccionar um ferimento.
Antes de introduzir a mão em orifícios, ilumine o interior com a lanterna e esteja certo que o buraco está vazio.
 
ANIMAIS PESADOS
Grandes animais também freqüentam os naufrágios. Tartarugas, Arraias, grandes Meros e Tubarões utilizam esses locais como áreas de moradia, descanso e até reprodução o que é uma grande vantagem para quem quer observá-lo. No caso de animais de grande geralmente permanecem escondidos em compartimentos ou áreas sombreadas. Por isso, os mergulhadores podem literalmente esbarrar com esses moradores, alguns dos quais passam fácil de 200 quilos. Trombar com um animal desses em fuga pode ser bastante perigoso.
Ao penetrar em naufrágios ou arrastar-se por pontos mais estreitos, tome o cuidado de não obstruir a saída, pois esses animais podem estar tentando fugir pela mesma abertura. Penetre sempre por um canto da abertura, deixando livre o centro da abertura e, principalmente, evite acuar os animais no interior dos destroços.
 

 

A fauna marinha tanto pode auxiliar como criar dificuldades para um mergulhador que se aventure em naufrágios, por isso, é recomendável procurar orientação em Cursos de Naufrágio que abordem o assunto ou mesmo em atividades de biologia marinha que apresentem as características dos organismos freqüentes nesses ambientes.
 

Curso de Mergulho em Naufrágios

 

Maurício Carvalho é biólogo, instrutor especialista em naufrágios, autor do SINAU (Sistema de Identificação de Naufrágios) e responsável pelo site Naufrágios do Brasil.

 

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