TÉCNICA DE MERGULHO
PRIMEIROS PASSOS EM UM NAUFRÁGIO

Revista SUB Nº2 Primavera 1992
 
OBSERVAÇÃO: É importante lembrar, que desde a publicação do artigo muitas técnicas de mergulho foram aperfeiçoadas e adotadas. Assim o texto técnico, deve servir como fonte de pesquisa histórica, não devendo ser as técnicas de mergulho tomadas como as melhores e mais atuais.
 

Cada mergulho em naufrágio reserva novas surpresa, o que torna a atividade sempre prazerosa. Esta é uma das vantagens em relação a outros tipos de mergulho. Em locais de águas freqüentemente turvas, o mergulho em naufrágio suplanta os demais, haja vista que, sendo a natação próxima ao fundo, a visibilidade não é fundamental para que você se divirta. Apenas em naufrágios intactos, onde pode haver penetração sob as estruturas, é que águas transparentes são indispensáveis. Apesar das vantagens, águas turvas tornam a orientação mais difícil. Assim, para o sucesso de um mergulho em naufrágio, você deverá conhecer muito bem tanto a localização dos destroços como sua distribuição no fundo.
Algumas técnicas poderão auxiliá-lo nestas tarefas, e com algum treino você perceberá que elas lrão se tor-nar automáticas durante a prática, sendo executadas com rapidez e precisão Com certeza, quando você come-çar a mergulhar slstematicamente em naufrágios, terá a oportunidade de visitar alguns que já foram localizados por outro mergulhador; mesmo nes-tes casos, gaste alguns minutos, du-rante a preparação, para marcá-los. Isso permitirá que você volte futuramente ao local, mesmo quando não estiver acompanhado por quem o levou.
A marcação de um ponto no mar é uma técnica muito simples, se dele for possível enxergar a terra. Tais técnicas são amplamente abordadas nos cursos de mergulho avançado.

A Marcação

A marcação de um local no mar está baseada na utilização de visadas de pontos no litoral. Para isso, é necessário que você encontre, em terra, no mínimo, dois elementos notáveis -- objetos que se destaquem na paisagem --, separados, pelo menos, por um ângulo de 70 graus. Podem ser prédios e rochas com formato pe-culiar ou até mesmo uma árvore. Tome apenas o cuidado de escolhê-los bem nítidos, permanentes e de limi-tes definidos.
Escolhido os objetos, você deve mar-car suas posições precisamente. Para isso, posicione cuidadosamente a bússola fazendo a leitura do ângulo da primeira referência escolhida -- linha de visada --, repetindo o procedimento com as outras referências.

O ponto de interseção entre as linhas de visadas será o exato local a ser marcado. Note que só existe um ponto comum entre duas linhas que se cruzam. Procure utilizar em suas marcações mais de dois pontos de referência, garantindo, assim, encontrar o naufrágio mesmo quando um dos pontos não puder ser avistado -- ele pode estar encoberto por um navio ou pelo nevoeiro. Anote os valores dos ângulos para lembrar-se futuramente. Feito isso, é hora de iniciar o mergulho. No caso do naufrágio não estar localizado, será necessário adotar técnicas de busca e
localização, que também são ensinadas nos cursos de mergulho avançado -- assunto muito vasto, que não abordaremos por ora. Para este tipo de mergulho, o método mais comum, adotado quando o navio choca-se com a costa, é o padrão de contorno. Nele, os mergulhadores executam a busca acompanhando "paralelamente" o perfil da costa onde se supõe que o navio tenha afundado. Quando um navio se choca contra a costa, na maioria das vezes, permanece posicionado perpendicularmente à terra. Assim, em algum momento durante o percurso de busca, os mergulhadores deverão passar sobre ele -- considerando que o navio ainda mantém uma certa integridade. A área e a profundidade da busca devem ser estabelecidas em função de vários fatores: águas agitadas dificultam a natação na superfície, a espuma diminui a visibilidade do fundo e a areia, o corai (ou outros organismos marinhos) podem cobrir parte dos destroços, camuflando sua localização. Um naufrágio muito profundo não permite longa autonomia de ar, o suficiente para uma busca apropriada. A profundidade entre 10 e 12 metros costuma ser ideal para a natação, pois inexiste a agitação da superfície e a autonomia de ar, além da luz ser satisfatória. Localizados os destroços, marqueos imediatamente com uma bóia, retorne à superfície e execute os procedimentos de marcação do locai com a bús-sola. Agora é o momento de começar a conhecer o naufrágio.
Planejando o mergulho
Antes de iniciar a exploração dos destroços, planeje seu mergulho. A imersão sempre deve ser feita do ponto de maior para o de menor profundidade. Portanto, é importante localizar a parte mais funda do naufrágio (como nem sempre isso é possível, deve-se estipular uma profundidade máxima para o mergulho e mantê-la como limite). Procure adequar seu tem-po de fundo às características do naufrágio. Navios muito grandes não podem ser explorados adequadamente em um único mergulho, devido à limitação do suprimento de ar. Desse modo, restrinja o tempo de fundo a uma seção do navio. Uma vez que um naufrágio é formado de milhares de partes, conhecê-lo em detalhes não é tarefa das mais fáceis. Uma boa maneira de se conseguir isso é preparando um croquí dos destroços. Para isso, durante todo o mergulho, você deve fazer, em uma planilha de escrita subaquática, pequenas marcações das posições das peças mais importantes do naufrágio: caldeiras, âncoras, hélice, motores, guinchos, entre outros. Com este mapa básico, será mais fácil conhecer como as partes do navio estão distribuídas no fundo. A partir do croquí iniciai, você poderá, a cada mergulho subseqüente no mesmo naufrágio, aperfeiçoá-lo, chegando a um mapa bastante satisfatório do sítio de mergulho. Crie sinais gráficos que representem as partes mais encontradas nos naufrágios, facilitando a representação na planilha debaixo d'água. Na superfície, uma comparação do seu croquí com o do seu parceiro mostrará uma condição mais próxima da realidade. Em um naufrágio existem multas pontas e arestas afiadas, por isso. se a natação for próxima dos destroços, ela deve ser feita com muito cuidado. Luvas grossas e joelheiras são muito importantes para garantir que não ocorram cortes na roupa ou mesmo pequenos arranhões. Para os mergulhos em naufrágios desmantelados -- destroços que já desmoronaram --, os cuidados não precisam ser excessivos, pois não há penetrações sob as estruturas, livrando-se o mergulhador da ausência de luz, dos caminhos labirínticos e das peças soltas. Oportunamente abor-daremos as penetrações em navios intactos, que por sua complexidade exigem técnicas bem mais elaboradas, assemelhando-se muito aos mer-gulhos em gruta. Deste modo, procure manter uma exploração externa do naufrágio, até adquirir técnicas complementares que permitam a você expandir sua atuação nos destroços.
 

Maurício Carvalho é biólogo e Instrutor de mergulho, com especialidade em Rescue e naufrágios, tendo sido supervisor de mergulho em gruta do GREC-DF.Brasil.
OBS: Na matéria original constam outros fotos.
 

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