TÉCNICA DE MERGULHO
Quando falta o ar

 
Revista Mergulhar, ano VII, Nº 51, agosto/1989
Maurício Carvalho
OBSERVAÇÃO: É importante lembrar, que desde a publicação do artigo, muitas técnicas de mergulho foram aperfeiçoadas e adoptadas. Assim o texto técnico, deve servir como fonte de pesquisa histórica, não devendo ser as técnicas de mergulho tomadas como as melhores e mais atuais.
 
São muitos os fatores que causam a interrupção da respiração do mergulhador, entre eles estão: o término do suprimento de ar disponível na garrafa e a desregulagem do segundo estágio que, no caso de um regulador de pistom não balanceado poderá, com a diminuição da pressão na garrafa, tom ar a respiração impossível.
Depois de alguns anos mergulhando, mesmo para aqueles que cuidam criteriosamente de seus equi-pamentos, é possível que, certo dia, venha a acontecer um erro no procedimento ou uma falha no sistema de respiração, ocasionando interrupção no fornecimento de ar. Para este caso e outros que podem ocorrer, sempre será de grande valia a companhia de outro mergulhador. Porém, com freqüência, encontramos mergulhadores que não estão aptos nem mesmo a fazer uma respiração junto com o companheiro - lembre-se que algumas vezes não o conhecemos, como por exemplo quando mergulhamos fora de nossa cidade. Por isso, aqui vão algumas dicas sobre os procedimentos relativos à interrupção do fluxo de ar.
São muitos os fatores que causam a interrupção da respiração do mergulhador, entre eles estão: o término do suprimento de ar disponível na garrafa. Isso pode ser causado, quer pela falta de manômetro ou sistema de re-serva no equipamento, quer por um defeito no manômetro. Já aconteceu comigo do ponteiro ficar parado em de-terminado ponto da escala. No caso de se estar distraído, não se percebe a parada de variação - sempre que olhar o manômetro verifique se ocorre uma pequena movimentação do ponteiro durante a inspiração, isso ga-rante em parte o bom funcionamento. Neste caso, se o mergulho estiver sendo controlado pelo ar remanescente haverá o término ainda durante o mergulho; outro problema freqüente é a desregulagem do segundo estágio que, no caso de um regulador de pistom não balanceado poderá, com a diminuição da pressão na garrafa, tornar a respiração impossível. O caso inverso também pode impedir a respiração normal. E fato comum o freeflow no segundo estágio, onde, por algum motivo, o pistom fica retido aberto e o regulador libera tanto ar que inviabiliza a respiração.
Solucionando problemas
O uso do octopus- segundo estágio auxiliar levado durante o mergulho - é muito pouco difundido no Brasil, sendo, inclusive os mergulhadores que o utilizam, encarados de maneira desconfiada. Entretanto, seu uso é de grande ajuda em certas situações: pode-se, por falha no regulador principal, facilmente passar a respirar por ele. No entanto, se o problema persistir, a falha não será no segundo estágio, devendo ser procurado o parceiro como fome de ar. 0 octopus possui algumas características particulares. Em geral, é um regulador menor, com bigo-de reduzido, para facilitar sua acomodação no bolso do colete ou outro local. Possui uma mangueira mais longa e ao invés dos 70 cm costumeiros ela mede um metro, o que facilita a utilização pelo companheiro. A regulagem deve ser um pouco mais dura, para evitar o freeflow o parceiro, assinalando a falta de ar e sua intenção em praticar uma respiração a dois (Fig. 1). Sobre este tipo de respiração, há alguns pontos importantes para serem considerados. Alguns instrutores orientam os alu-nos a aproximarem-se para este tipo de respiração por um lado e uma posição específica. Porém, é pedir demais que numa emergência, após nadar alguns metros em apnéia, multas vezes expiratória, pois só se percebe a falha após exalar se o ar e tentar uma nova inspiração, o "acidentado" ainda procure o lado e posição certos. É mais fácil que ele arranque o regulador de sua boca. Desta forma, é importante que, ao perceber uma emergência, você procure facilitar ao máximo as primeiras respirações do companheiro. No caso de possuir um octopus, dependendo do estado de angústia do outro mergulhador, é melhor que você lhe ceda o segundo estágio principal, respirando no auxiliar para, depois de acalmada a situação, efetuar a troca, visto que na ânsia de respirar a atenção do mergulhador estará toda no regulador que você traz à boca.
Contornada a situação, deve-se começar imediatamente uma subida controlada. Para isto, existem várias técnicas das quais preferimos a seguinte: apoiando-se no companheiro pelo back pack, coloque-se em uma posição de 45° em relação ao seu parceiro, passando-lhe o regulador e segurando-o pela mangueira bem junto ao segundo estágio e deixando todo o corpo do regulador, para que a pessoa assistida possa apoiá-lo para facilitar a colocação na boca (Fig. 2). Mão sobre mão ou mão segurando no pulso, que são as outras técnicas mais difíceis de administrar em condições reais. Não se pode esquecer de ir liberando o ar durante a subida, mesmo quando o companheiro estiver com o regulador. No caso de você estar recebendo ar, mantenha a calma e, após algumas respirações para retomar o fôlego, devolva o regulador. Lembre-se que o companheiro pode ter cedido o se-gundo estágio após a expiração, o que embora seja tecnicamente errado, pode ter acontecido devido ao grau de emergência da situação. A freqüência respiratória pode ser de uma ou duas para cada mergulhador alternadamente.
Na eventualidade de você estar mergulhando sozinho, ou seu companheiro estar fora de alcance, restam algumas saídas: a primeira, é a subida livre que, por ser um procedimento que pode levar a uma embolia traumáti-ca pelo ar, não será discutida aqui, uma vez que deve ser tratada com mais detalhes (veja Revista Mergulhar, nº 21 - Subida Livre); a segunda, é fazer uma respiração pelo colete equilibrador (é possível já que o ar no interior do colete está na mesma pressão do ambiente externo). Este procedimento só é possível para os que possuem um colete com enchimento automático, diretamente do primeiro estágio ou de uma pequena garrafa de ar comprimido auxiliar. No entanto, esta técnica pode ser perigosa pelo enchimento do colete durante a subida e deve ser bem treinada sob orientação e condições controladas, pois sua execução errônea pode causar também embolia traumática. Para este procedimento também existem algumas variações. Procuramos abordar aqui a mais segura e simples na execução, ou seja:
Em primeiro lugar você deve injetar uma pequena quantidade de ar diretamente da garrafa no colete, não mais do que um segundo de acionamento do botão, de maneira que você não ganhe impuxo vertical. Logo após, coloque o tubo oral do colete acima da cabeça sem acionar o botão para retirar a água que está no tubo sanfonado e ela irá, conseqüentemente, para dentro do colete. Em seguida, coloque o inflador oral na boca e dê uma ligeira soprada para certificar-se que não há mais água; de-pois, é inspirar lentamente. Após dois ou três ciclos respiratórios, retire um pouco de ar do colete e recomece o processo. Lembre-se que, subindo, é preciso libe-rar qualquer excesso de ar no colete e este começar a empurrá-lo para cima e no pulmão de maneira que ele permaneça com o volume constante. Atenção: as pequenas garrafas usadas para enchimento rápido do colete em emergências são cheias com CO2 não servindo, por isso, para a respiração pelo colete.
Por fim, com maior grau de dificuldade, está a respi-ração diretamente na torneira da garrafa, porém isto só deve ser tentado em última instância, quando mais nenhuma fonte de ar for possível e uma subida livre estiver fora de cogitação. Este procedimento só seria necessário no caso de um defeito no primeiro estágio. Deixar de nadar até o companheiro e tentar desmontar o regulador para respirar direto na garrafa é, na melhor das hipóteses, uma insensatez.
Esta técnica consiste em retirar o primeiro estágio da torneira, o que implica fechar a garrafa e retirar o ar do Sistema. Algumas vezes isto pode ser impossível devido ao defeito, e controlar o fluxo de ar no registro, a colar a boca na saída de ar deixando formar um bolsão de ar no céu da boca, e quando este atingir o nível da garganta ir inspirando lentamente. Experimente este exercício sob orientação e verá a dificuldade de executá-lo no mar. Em condições normais é muito mais fácil que um pou-co d'água seja engolido ou excesso de ar inspirado.
A despeito das duas últimas técnicas necessitarem de muito treinamento para surtirem efeito em condições reais, as demais devem ser necessariamente dominadas pelo mergulhador de modo a tornar mais seguro o mergu-lho. Multas variações dos procedimentos descritos aqui podem ser encontradas e não é obrigatório conhecer todas, mas dominar uma é fundamental. Em caso de dúvida, procure seu instrutor para alguns treinamentos.

Figura 1

Figura 2
 

OBS: Na matéria original constam outros fotos.
Maurício Borges de Carvalho é supervisor de mergulho em gruta. Mergulhador autônomo 3 estrelas.

voltar a biblioteca