Condições Estruturais de um Naufrágio

Jornal Sub ano II Nº 15, março 1993
Texto: Maurício Carvalho
 
Quando se mergulha freqüentemente em naufrágios, é fácil perceber que cada um tem uma configuração diferente. A disposição que os restos de um navio assumem, no fundo, é o resultado da interação das características de construção da embarcação e das condições do meio ambiente a que ela é submetida durante ò afundamento e no local que permaneceu afundada. Por isso, quando se pretende explorar destroços, é importante ter idéia dos fatores que atuam sobre um naufrágio, para saber antecipadamente as prováveis condições a serem encontradas.
O Navio
A primeira pergunta que um bom explorador de naufrágios costuma fazer é: quando o navio afundou? A data do acidente é valiosa para indicar o estado dos destroços, mostrando com o que poderá o mergulhador se deparar. Navios de séculos passados eram na sua maioria construídos de madeira e, no máximo, recobertos de chapas de cobre; assim sendo, se estes navios estavam sujeitos aos agentes do meio -- organismos marinhos, ondas, temperatura, sal, etc. -- é provável que pouca coisa do madeirame -- quilha e cavername -- tenha resistido (vide navios enterrados).
Analisando navios do nosso século, podemos utilizar as décadas como uma escala de conservação dos despojos. Navios das décadas de 50 em diante, desde que tenham afundado com poucas ararias, mantém a unidade, sendo por isso chamados de naufrágios intactos. Navios afundados até os anos 40, geralmente, encontram-se em adiantado estado de desmonte ou já totalmente desmantelados, apresentando-se como uma grande massa de metais espalhada pelo fundo. Para identificar a disposição do navio, o que o ajudará na orientação durante o mergulho, procure por peças de posições definidas, como: guinchos, ancoras e hélices.
Muito comum nestes naufrágios é o aparecimento do cavername, que solto do casco e da superestrutura, assume a forma de costelas dispostas simetricamente nos lados da embarcação -- as maiores localizam-se próximas do centro do navio.
Outro dado muito importante sobre o naufrágio é a sua profundidade. Além, é lógico, do planejamento do mergulho depender deis, as condições do navio estio muito ligadas a sua proximidade com a superfície.
Navios Semi-submersos
Naufrágios semi-submersos são sem dúvida os que sofrem o deito mais acelerado da decomposição do material. Na superfície e próximo deis, o teor de oxigênio da água é maior, o que acelera muito a oxidação do ferro (ferrugem) com a conseqüente decomposição dos destroços. Também na superfície a força das ondas, marés e correntes oceânicas é mais acentuada aumentando o processo de destruição mecânica das estruturas. O peso do navio fora d'água, apoiado em partes acentuadamente corroídas pela ferrugem e enfraquecidas pelo embate do mar irá provocar o desabamento das estruturas acima da superfície, mesmo que as peças submersas ainda se encontrem em bom estado de conservação; nestas circunstancias, alguns navios parecem ter sido serrados logo abaixo da superfície.
Por todos estes motivos, os mergulhos em navios semi-submersos oferecem algum risco, pois sempre há possibilidade da queda de peças sobre o mergulhador ou deste ser jogado pela força do mar contra arestas de metal corroído.
Navios Submersos
Quando um navio está totalmente submerso seu processo de corrosão dependerá diretamente de sua profundidade; quanto mais fundo estiver o casco menor o efeito do ambiente sobre ele. Numa profundidade maior, diminui o oxigênio, o balanço do mar e a ação dos organismos marinhos, aumentando a durabilidade de qualquer material.
Destroços Enterrados
Embora o de soterramento de um naufrágio demore algum tempo para ocorrer, a velocidade deste processo pode garantir a melhor conservação dos despojos, principalmente em navios de madeira. Assim que um navio afunda, começa um lento processo de deposição de areia junto e sobre as estruturas, e da protege o material do navio da açulo cáustica da água do mar e de alguns organismos marinhos perfurantes. Debaixo da areia, geralmente, restam partes do navio bem conservadas.
Em naufrágios enterrados, multas vezes, só podemos observar partes dos destroços emergindo de tempos em tempos da areia; por isso, é importante executar uma busca em volta do último ponto do navio localizado. Note que a areia pode estar cobrindo uma parte baixa do navio, e a visibilidade da água impedindo a visão de uma superestrutura a alguns metros adiante (figura 1).
 


Figura 1

Motivo do Afundamento
Muita coisa pode acontecer com um navio na hora de seu afundamento, por isso, a posição dos destroços é sempre uma incógnita. Ao mergulhador resta conhecer as técnicas de mergulho a serem adotadas nas diversas condições.
Quando um navio se choca violentamente contra a costa ou pega fogo antes do afundamento, há ruptura de estruturas e conseqüentemente um desmonte mais rápido. Além disso, choques violentos e explosões, como das caldeiras, podem secionar totalmente mesmo um a embarcação de grande porte. Uma vez separadas, as partes do navio podem derivar durante o afundamento separando-se, no fundo, por muitos metros (figura 1).
A Posição do Navio
A posição do casco no fundo influencia diretamente a estrutura do naufrágio e a técnica de mergulho adotada. Pousado no fundo, em posição normal, o naufrágio resiste mais tempo ao desmonte, pois o peso de suas estruturas está apoiado nos lugares certos. Além disso, em tal situação, a orientação é mais fácil e maior quantidade de luz penetra no casco.
Quando o navio encontra-se caído de lado, no fundo, alguns cuidados devem ser tomado,, pelos exploradores, pois com certeza multas peças do interior estio soltas havendo o risco de desmoronamento. Pela própria disposição de portas, escotilhas e estivas de porão, menos luz penetra no casco, devendo o mergulhador providenciar luz artificial para iluminar sua penetração. A técnica de mergulho em naufrágio é uma das mais emocionantes e avançadas. Procure ser instrutor e converse com ele sobre o grande horizonte que pode ser aberto no mundo do mergulho, se você voltar os olhos para estes despojos abandonados à espera de nossa curiosidade. Com um bom curso e poucos equipamentos, os naufrágios poderão altera totalmente seus próximos mergulhos.

OBS: Na matéria original constam outros fotos.
Maurício Carvalho é biólogo e instrutor de mergulho, com especialidade em Rescue e Naufrágio, tendo sido supervisor do GREC-DF (Grupo de resgate e Exploração de Cavernas).
 

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