Destino: naufrágio

Vapor Bahia
Catástrofe, beleza e mistério.


 
Revista Mergulho, Ano XII - Nº 147 - Outubro/2008
Texto: Maurício Carvalho
 
O vapor Bahia é um dos mais importantes naufrágios da costa brasileira. Ainda assim, 170 anos depois da tragédia,
ronda uma aura de mistério sobre os acontecimentos. Teria sido acidente ou vingança amorosa?
Por muito tempo, os fatos alimentaram o imaginário popular, o que rendeu versões das mais fantasiosas,
como demonstra o poema de Seguro Wanderlei publicado no Diário de Pernambuco de 1887.
 

O vapor de rodas Bahia, da Companhia de Navegação a Vapor, era um dos mais importantes navios que ligavam os portos do Nordeste ao Sudeste.
No dia 24 de março, ele deixou o porto de Camocin, no Ceará, com destino a Porto Alegre e escalas no Recife, Rio de Janeiro entre outros portos.

A seu bordo um total de mais de 200 pessoas, entre eles o 15º Batalhão de Infantaria do Exército.
No dia 24 de março o Bahia navegava no través de Ponta de Pedras no norte do estado de Pernambuco. Por voltas das 23 horas, com o mar calmo e a noite clara foi avistado, navegando em sua direção, outro navio. Embora tenham sido feitas mudanças no rumo o Bahia acabou sendo violentamente atingido a bombordo pelo vapor Pirapama da Companhia Pernambucana de Navegação Costeira.
A proa do Pirapama provocou enorme estrago no costado, o que provocou o afundamento do Bahia em pouco mais de 10 minutos. Houve tempo apenas para arriar ao mar uma baleeira. Muitos passageiros nem mesmo saíram de seus camarotes.

 
 

Horrível alarido ouviu-se a bordo
Do Bahia que o choque suportou
E logo por desgraça muitas vidas

No abismo insondável sepultou

Partido ao meio, pelo impulso
Do choque que lhe deu o Pirapama
Submergiu-se nas águas repentina
Indo dar com o costado sobre a lama

Foi nesta confusão, desordem, caos
Quando todos imploravam salvação
Que fugiu do sinistro espavorido
Do Pirapama, o covarde capitão

Covarde sim, porque não teve o ânimo
Que não deve faltar ao marinheiro
Quando o perigo ante seus olhos
No momento terrível derradeiro.

E quando deste modo, aquele monstro
Com seus irmãos aflitos procedia
No Bahia, o valente comandante
Salvando muitas vidas perecia

Que ação nobre e sublime,
Que exemplo edificante
Foi este que soube dar
Tão distinto comandante.

Pessoas atiraram-se ao mar sem roupas, tentando se salvar agarradas aos mastros, velame e cordame que permaneciam fora d'água, ou em quaisquer outras coisas que flutuassem.
Algumas jangadas e barcaças que acorreram em socorro ao acidente, recolheram muitas vítimas em sucessivas viagens, porém muitas permaneceram na água por mais de seis horas.
Nos dias que se seguiram a tragédia, trinta cadáveres flutuaram em volta dos destroços, inclusive o do comandante do Bahia. Quatorze corpos chegaram às praias próximas ao local dos destroços, sendo alguns já irreconhecíveis, enterrados no cemitério da localidade de Ponte de Pedras, onde ainda existe o túmulo.
O Acidente entre o Pirapama e o vapor Bahia é cercado de muito mistério e histórias fantasiosas. A mais curiosa delas, da conta, de que um relacionamento amoroso entre o comandante do Bahia e a mulher do capitão do Pirapama seria a razão para o vingativo choque. Por mais pitoresca que possa parecer esse caso de traição naval e pouco provável que os demais oficiais na ponte do Pirapama, fossem permitir tamanho ato de insanidade.


O comandante Francisco Carvalho do Pirapama foi acusado seguidamente de negar socorro às vítimas do Bahia, mas nada foi provado contra ele e um manifesto dos passageiros deste vapor,
afirma que ele agiu com destreza e correção durante o acidente.

No acidente, o Pirapama sofreu o choque na proa. Após uma rápida parada de máquinas, e, segundo os oficiais de bordo, depois que o Bahia seguiu viagem, retornou a Recife a meia-força, com muita água no porão de proa, mas sem vítimas. Chegou ao porto por volta das 7:00 horas da manhã do dia 25 de março. A partir daí, a saga do Pirapama também passa a ser um mistério, mas isso já é outra história.

 

 

O MERGULHO
Dificilmente um mergulhador apaixonado por naufrágios encontrará destroços tão belos quanto o do Bahia. O navio mantém sua linha básica, adernado ligeiramente e apoiado em um fundo de areia muito branca.
A proa alta, está quebrada logo atrás do castelo de proa, onde estão o guincho e âncoras reservas. De cada um dos lados, caída na areia, uma âncora.
Em direção a meia-nau, o porão de proa, muitos ferros e os dois costados abertos. No centro da embarcação encontramos duas grandes caldeiras. A roda de propulsão de bombordo está inteira e a de boreste totalmente quebrada.
Atrás das caldeiras estão muitas peças auxiliares e as máquinas.
Das máquinas para a popa, encontramos o costado de estibordo totalmente caído para fora e ligeiramente enterrado.
No final dos destroços caído a bombordo está o leme e seu volante.

 
 
 
Por todos os lados do navio cardumes de enxadas, pirangicas e xaréus. Além de Raias e tartarugas. Entre os destroços, muitos peixes coloridos, moréias, lagostas e diversos lambarus dormindo tranqüilamente. O cenário de paz, que hoje reina, não lembra nem de longe a tragédia que marcou marcou para sempre este famoso naufrágio.
 

FICHA TÉCNICA

DADOS TÉCNICOS
NOME DO NAVIO: Bahia
DATA DO AFUNDAMENTO: 24.03.1887
LOCAL: Ponta de Pedras, PE.
POSIÇÃO:
Ao largo
LATITUDE:
07º. 34'.786 Sul.
LONGITUDE:
034º. 42'.152 West.
PROFUNDIDADE MÍNIMA: 18 metros
PROFUNDIDADE MÁXIMA: 25 metros
CONDIÇÕES ATUAIS: desmantelado.

 

DADOS TÉCNICOS
NACIOLNALIDADE: Brasileira
ARMADOR: Companhia Brasileira de Navegação a Vapor

ESTALEIRO: Palmer's Co.
COMPRIMENTO: 74 metros
BOCA: 8 metros

TIPO DE EMBARCAÇÃO: Vapor de Rodas
MATERIAL DO CASCO: ferro
PROPULSÃO: Vapor
CARGA PRINCIPAL: Café
MOTIVO DO NAUFRÁGIO: choque com o vapor Pirapama
 
 

Curso de Mergulho em Naufrágios

 

Maurício Carvalho é biólogo, instrutor especialista em naufrágios, autor do SINAU (Sistema de Identificação de Naufrágios) e responsável pelo site Naufrágios do Brasil.

 

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