Destino: naufrágio

Rompendo Bloqueios

Investigações sobre a causa do afundamento do Wakama
provoca primeira operação com trimix no Brasil


 
Revista Mergulho, Ano XII - Nº 139 - fevereiro/2008
Texto: Maurício Carvalho
 

Era fevereiro de 1940, a 2ª guerra recém-iniciada no Velho Mundo, era apenas um sussurro no Brasil. O país permanecia neutro, amparado pelo Tratado de Neutralidade do Panamá.
O drama do cargueiro alemão Wakama começou no dia 27 de agosto de 1939, quando chegou ao Rio de Janeiro acuado pelo bloqueio comercial imposto pela Inglaterra e França. Aqui, ele permaneceu ancorado até a madrugada de 12 de fevereiro de 1940, quando, carregado de produtos vegetais e minerais extremamente necessários ao esforço de guerra alemão, partiu numa tentativa desesperada de romper o bloqueio naval.
Às 14h27 daquele dia, foram captados pelas estações telegráficas e por vários navios um único pedido de socorro desesperado "S.O.S. Wakama afundando". Dois navios brasileiros deslocaram-se imediatamente para o local respondendo ao pedido de socorro. Chegaram lá já à noite e não encontraram vestígios algum do cargueiro.

Teria o Wakama afundado?
  
 


FICHA TÉCNICA

DADOS DO NAUFRÁGIO
NOME DO NAVIO: Wakama
DATA DO AFUNDAMENTO: 12.02.1940
LOCALIZAÇÃO: a 18 milhas de Cabo Frio
(Rio de Janeiro);
POSIÇÃO: Latitude 22º 35' S e
Longitude 041º 39' W).
PROFUNDIDADE: de 40 a 60 metros.
CONDIÇÕES ATUAIS: semi-inteiro.

DADOS TÉCNICOS
NACIONALIDADE: alemã.
ANO DE FABRICAÇÃO: 1921.
TIPO DE NAVIO: cargueiro.
MEDIDAS: 112 metros de comprimento,
15.3 de boca e deslocamento de 3.771 T.
CARGA DECLARADA: Quartzo, Níquel,
linhaça, café, feijão, algodão, fumo e borracha.


 No dia seguinte atracou no Rio de Janeiro o Cruzador HMS Hawkins, um dos dois vasos de guerra ingleses que patrulhavam a costa sul-Americana. A bordo, o almirante Henry Hardwood que voltava da campanha de afundamento do encouraçado Graf Spee no Rio da Prata, Uruguai.
Após dias de forte assédio da imprensa, Sir Hardwood divulgou a versão inglesa dos acontecimento: " às 14 horas do dia 12 de fevereiro, um dos dois aviões de reconhecimento do cruzador inglês localizou o Wakama. O Hawkins intimou o cargueiro a parar máquinas; em seguida, a tripulação do cargueiro abandonou o navio, ateando fogo e pondo-o a pique. Os 10 oficiais e 36 marinheiros foram resgatados pelo cruzador e levados prisioneiros para a Inglaterra". A guerra chegava finalmente às costas do nosso país.

Relatos de pescadores locais, no entanto, contam que o navio inglês abriu fogo contra o vapor alemão pondo-o a pique. É certo, que em 1940, o Brasil - ainda neutro na 2ª Guerra Mundial - protestou veementemente contra a ação Inglesa, ( * no que seria) o primeiro ato de guerra em águas brasileiras. Chegou-se a falar em declaração de guerra à Inglaterra, o que teria mudado o rumo da história do país. Em 1942 depois de seguidos ataques dos U-boats contra navios brasileiros o Brasil finalmente declarou guerra às forças do Eixo.

(* texto original removido na edição)
 

FIM DO BLOQUEIO DO TRIMIX

Ao longo dos 2.000 Km da costa Brasileira, as condições dos naufrágios são muito variáveis. No sudeste, apesar de bons pontos de mergulho, abaixo dos 30 metros, as águas costumam ter temperaturas de até 12º C e visibilidade média de 3 metros - o que faz com que, em mergulhos profundos, o uso de misturas gasosas seja recomendado.
Por isso, só a partir de 1996 com o desenvolvimento do mergulho técnico, naufrágios como o Wakama puderam ser atingidos e explorados com segurança.

Em 1997, a união de dois desbravadores abriu o caminho para o Mergulho Técnico no Brasil. O Instrutor Carlos Beltran localizou os destroços do Wakama e a operadora CIMA do Rio de Janeiro, criou condições para a preparação das primeiras misturas de Trimix amador. Vencido os bloqueios, montamos rapidamente as primeiras expedições para o Wakama e uma nova fase do mergulho no Brasil estava inaugurada.
Apesar da pouca experiência com misturas, as boas condições do mar e um pouco de sorte tornaram essas primeiras operações amadoras com o uso de trimix um sucesso e o Wakama pode ser conhecido.


O MERGULHO NO WAKAMA

 

A natureza embelezou ainda mais o naufrágio com gorgônias.

Para alcançar o Wakama parte-se de Búzios. São cerca de 25 milhas de navegação. O mergulho pode ser feito em qualquer período do ano, mas durante o verão as águas são mais claras e o efeito das frentes frias é menor.
O dia anterior ao mergulho é normalmente reservado à preparação das misturas respiratórias e acerto de todo o equipamento. O embarque do equipamento é feito no final do dia anterior. Depois de todos os preparativos, a partida - ainda na madrugada - torna-se mais tranqüila.
Difícil mesmo, será dormir cedo; pois Búzios, conhecida pelas belas praias e agitação noturna começa a acordar depois das 22h. Às 4:30 da madrugada, quando normalmente as equipes acordam, a festa ainda corre solta e para os bêbados de plantão mergulhadores carregando scooters e duplas são sempre um espetáculo de circo, alegremente comemorado.
A madrugada de Búzios é saudada por um vento forte e fresco e o mar ligeiramente ondulado, porém com o raiar dia, o vento para e o mar tranqüiliza-se. São cerca de 3 horas de navegação até o Wakama, o GPS marca o rumo devido a falta de marcas de terra, a equipe de bordo deve ser muito eficiente para localizar os destroços.

 

Destroços do Wakama, observação
desejada, trimix recomendado
 O MERGULHO
Da superfície até cerca de 40 metros a água oceânica costuma ser muito clara e as correntes são fracas ou inexistentes, grandes grupos de xaréus circulam o topo dos destroços e em várias ocasiões, mantas foram vistas durante a descompressão. Abaixo dos 40 metros, nos espera uma termoclina e aí começam os problemas: à temperatura caindo rapidamente para 12º C e a visibilidade, em média, para 4 metros.
O navio está posicionado corretamente no fundo. Pelo lado de fora, o casco que permanece quase íntegro é colonizado por grande quantidade de gorgônias vermelhas que contrastam, sob as fortes lanternas, com o marrom escuro do metal enferrujado.
O convés está recoberto de pequenas anêmonas amarelas e centenas de Ceriantos.
 
Existe risco nas grossas redes de pesca que se espalham por todo o navio.
Apesar da água escura, Na proa, em torno dos 50 metros, pode ser vistos caídos sobre o convés um grande mastro, guinchos e outras peças. As entradas abertas do porão, ainda são claramente visualizadas. Seguindo por bombordo, chegava-se a um grande rombo que expõe o interior dos destroços; parece ter sido resultado da explosão do casco durante o ataque ou dos trabalhos de resgate de parte da carga, realizados na década de 50.
O casario de meia-nau não mais existe e grande quantidade de ferros espalha-se sobre o convés. No segundo porão, caixas com garrafas e outros produtos ainda estão empilhadas.
A popa está ligeiramente adernada e o hélice e leme ainda são visíveis, junto ao fundo de lodo a 60 metros. Junto ao porão de popa o convés, está adernado para estibordo, parcialmente destruído, a grande escotilha do porão permanece aberta e ele está praticamente vazio, partes do casco está destruído.
O principal objetivo dos mergulhos têm sido procurar provas do ataque ao cargueiro, o que esclareceria definitivamente quem cometeu o primeiro ato de guerra em águas brasileiras.
 
 

Curso de Mergulho em Naufrágios

 

Maurício Carvalho é biólogo, instrutor especialista em naufrágios, autor do SINAU (Sistema de Identificação de Naufrágios) e responsável pelo site Naufrágios do Brasil.

 
Veja mais em: Naufrágio do Wakama ou História completa
 

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