Destino: naufrágio
Farejando os naufrágios do Brasil


 
Revista Mergulho, Ano XVI - Nº 186 - janeiro/2012
Texto: Maurício Carvalho
 
A pesquisa de naufrágios tem muito do trabalho de um detetive. Pistas, vestígios e lógica são necessários para encontrar novos navios.
Muitos mergulhadores já realizarão treinamentos de busca, no entanto, vale a pena lembrar que não se está a procura daquela pequena boia escondida por seu instrutor durante o Curso de Mergulho Avançado ou de Busca e Recuperação.
Um naufrágio tem uma história que se desenrolou de forma, quase sempre lógica, até o momento do acidente. Se conhecermos sua história existe uma boa chance de localizar rapidamente os destroços. Mas se a narrativa está fragmentada, só resta ao mergulhador começas a dar uma de Sherlock Holmes unindo as peças que possui.
Como nos quebra-cabeças, mesmo ainda com muitas partes por completar, na maioria das vezes, temos uma idéia parcial de qual imagem se formará.
 
Por onde começar ?
 

1º Junte todas as informações que puder

Você já pensou que os mergulhadores do país unidos podem formar uma grande rede de captação de informações. Nas suas saídas de mergulho comece a conversar com marinheiros, moradores locais, principalmente os mais antigos e pescadores. Pergunte pelos naufrágios e histórias do locais. Não espere que alguém adivinhe que você tem particular interesse em um acidente local acontecido a mais de cem anos.
Lembre-se que muito da memória oral perde-se a cada ano com a mudança das gerações. Recuperar e registrar a história é uma obrigação de toda nação e os mergulhadores são um grupo importante desse processo.
Naufrágios são eventos tão importantes que vários deram nome aos locais de seu acidente, como: Praia de Camboinhas, RJ. e Guanabara, ES. Esses eventos marcam a vida de muitas pessoas. Talvez a conversa não renda um naufrágio novo, mas uma boa prosa já está garantida.

 

2ª Torne cada viagem instigante

Você marcou aquela viagem para a casa de praia dos amigos. De repente, nem são seus amigos, vida em família é assim. Você não está muito animado? Mas, quem sabe uma pesquisa rápida, não o faça descobrir que você está viajando para a famosa praia de um naufrágio do qual você já havia ouvido falar.
Em muitas praias do sul do Brasil e no nordeste os naufrágios podem ser vistos encalhados, alguns com peças espetaculares expostas principalmente na maré baixa. Vários navios também estão a poucos metros da areia e são facilmente acessíveis com uma máscara e snorkel. Fotos serão mais do que bem vindas. Cabe alertar, que naufrágios na zona de arrebentação requerem mais atenção. Pois, além da oxidação ser aceleradas, a força das ondas trabalha o metal que se torna rapidamente instável.
Um mergulho inesperado, não planejado antes da viagem, em um naufrágio que quase ninguém conhece, pode tornar-se o grande momento do feriadão.
A pesquisa também vale para museus, navios antigos abertos a visitação e outros centros de informação.

 


Foto do motor do navio Lidice
Arraial do Cabo, RJ.

3º Acredite em suas descobertas

Muitos mergulhadores adoram naufrágios, mas não valorizam as peças que estão vendo, pois acreditam que todos que mergulharam ali anteriormente, já reconheceram o que está no fundo. A verdade não é bem assim. Para a maioria dos mergulhadores, naufrágios são apenas um monte de destroços. É preciso um olhar treinado para reconhecer certas peças, principalmente em posições e locais não usuais.

 


Pá de um hélice armado

Mesmo os guias de turismo sub, depois de um certo tempo, passam pelo fundo sem registrar detalhes, preocupam-se com organismos importantes que passam, o resto é pano de fundo. Nos naufrágios as coisas são estranhas, você mergulha em um dia e é o mesmo cenário de sempre, vem uma tempestade, e no próximo mergulho um compartimento novo foi aberto, novas peças foram descobertas pela areia e tudo é novidade.
Na última viagem a Florida, mergulhamos em um naufrágio a que dão pouca importância no local, tanto que deu trabalho descobrir o nome do navio, pois quase ninguém a bordo sabia de quem se tratava.
Durante a conversa no intervalo de superfície um dos guias me disse a achava que a data do naufrágio era a metade do século XIX, comentei meio displicentemente, que não era possível, pois o hélice armado só havia começado a ser produzido em 1890.
Com um sorriso maroto, ele disse que o navio era um veleiro e não tinha hélice, fomos obrigados a mostrar as fotos do Ivo Brasil, onde eu passava calmamente pela pá do hélice. A cara dele foi engraçada, ele me disse que mergulhava ali há 30 anos, mas que gostava mesmo de tubarões. Entende-se, o olhar faz toda diferença.
 
4º Treine seus olhos para ver mais do que um monte de ferro velho

Naufrágios são uma caixa de surpresas, mas a caixa está aberta. Para ganhar este prêmio basta abrir os olhos.
Mergulhadores com frequência dizem que após o curso de naufrágio um ponto em que já haviam mergulhado se tornou completamente após treinamento.
Infelizmente nos últimos anos, muitos mergulhadores passaram a investir pesadamente em viagens e muito pouco em treinamento.
 
Faça o teste abaixo. Você sabe que peça está vendo?
Foto 01

Foto 02

Foto 03
Foto 04
Veja o resultado no final do texto
Cada uma das viagens para locais fantásticos e distantes como Tailândia ou Micronésia poderiam ser muito mais bem aproveitados se você investisse em treinamentos. Assim poderia conhecer melhor a fauna marinha, as peças dos naufrágios ou a confecção de boas foto e vídeos.
Lembre-se que cada mergulho lá fora, individualmente custa muito caro, com um pequeno investimento ele poderá render muito mais prazer, além de tornar-se mais seguro e confortável.
 
O mergulho é uma atividade maravilhosa, porém com objetivos ela á ainda mais proveitosa, ocupando mais tempo de sua rotina e retribuindo mais por sua dedicação. Escolha uma das muitas especialidades e mergulhe de cabeça, você vai ver que mesmo fora d´água, o mergulho pode ser um grande barato.
 
 

Resultado do teste: Foto 01 - caldeira foto; Foto 02 - pá da roda de propulsão; foto 03 - hélice; foto 04 - cabeço de amarração.

 
 

Maurício Carvalho é biólogo, instrutor especialista em naufrágios, autor do SINAU (Sistema de Identificação de Naufrágios) e responsável pelo site Naufrágios do Brasil.

 

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