..NAUFRÁGIO do RANCO CRUSADER
 
 

Histórico
O rebocador Ramco Crusader de 68 metros de comprimento foi construído em 1983 nos estaleiros Estaleiro: Dae Dong Shipbuilding CO LTD em Busan na Coreia do Sul era de propriedade da empresa Oceanlink Offshore III AS e era operada pela empresa polonesa Vestland Marine AS.
Era dotado de máquinas a Diesel / Twin Screw /CPP com uma potência total de 9600 kw atingindo uma velocidade de 16,5 nós.
Em um contrato previsto para cinco anos, prestava serviços para à Petrobras, dando apoio à sonda SS-75, localizada no poço Tango, na costa do Rio Grande do Norte.



Rebocador Ranco Crusader
 
 

DADOS BÁSICOS

Nome do navio: Ranco Crusader

Data do afundamento: 13.08.2013

LOCALIZAÇÃO

Local: Fortaleza

UF:CE.

País:Brasil

Posição: 30 milhas da Praia do Beberibe.

Latitude: 04º 49,7’ sul

Longitude: 037º 50,5’ oeste

Profundidade mínima: 16 metros

Profundidade máxima: 28 metros

MOTIVO DO AFUNDAMENTO: incêndio

DADOS TÉCNICOS
Nacionalidade: Bahamense Construção: 1983 Armador: Vestland Marine AS Estaleiro: Dae Dong Shipbuilding CO LTD
Tipo de embarcação: rebocador Comprimento: 68 metros Boca: 15 metros Tonelagem: 2.450 toneladas
Material do casco: aço Propulsão: máquinas a diesel com dois hélices
Carga: material de apoio marítimo

CONDIÇÕES ATUAIS: inteiro

 

 
Naufrágio
Por volta das 2:30 horas da madrugada, quando a embarcação navegava paralelamente a costa do Rio Grande do Norte, ocorreu um incêndio na casa de máquinas do rebocador. Foi dado o alarme de incêndio e imediatamente os procedimentos de combate foram postos em funcionamento e um pedido de auxílio foi emitido, sendo respondido pelas embarcações Viking Thaumas e Skandy Admiral, que prestavam apoio a plataformas na região.
As 03:40 horas a tripulação de 15 homens foi retirada do rebocador e as 4:00 horas a embarcação Skandy Admiral iniciou o combate as chamas.
O navio perdeu o seguimento e foi levado a deriva em direção a costa do Ceará. O rebocador derivou vazio e acabou por emborcar e naufragar as 21:40 horas do dia 13 a cerca de 30 milhas em frente a praia de Beberibe, a 85 quilômetros de Fortaleza.

No Relatório de Investigação de Segurança de Acidentes e Incidentes Marítimos - Naufrágio da embarcação "Ranco Crusader" da Diretoria de Portos e Costas da Marinha do Brasil existem fotos do navio em chamas e emborcado pouco antes do afundamento.

(https://www.dpc.mar.mil.br/sites/default/files/diian/rel_acidentes/ramco_crusader.pdf)
 

 
A descoberta do naufrágio - Rodrigo Bricks
Este é um relato sobre a expedição ao Naufrágio RAMCO CRUSADER ocorrido entre 12 de agosto de 2013 e mergulhado por nossa equipe em 27 de fevereiro de 2016.
Sobre o ocorrido no evento do naufrágio já há material suficiente publicado como o próprio relatório da Capitania dos Portos do Ceará¹ e também por reportagens², assim, não vou entrar nesse assunto, vou escrever sobre o mergulho e sobre a equipe de mergulhadores que contribuiu para que essa operação acontecesse.
No Ceará há um grupo de mergulhadores "naufrageiros" muito atuante, uma equipe de primeira qualidade que topa mergulhos em condições realmente difíceis, navegações bem longas no mar agitado e em barcos não apropriados para mergulho, os quais recentemente até publicaram um Atlas de Naufrágios do Ceará³. Por lá nós dizemos que quem mergulha no Ceará mergulha em qualquer lugar, mas apenas quem já "enfrentou" os verdes mares bravios naquela região vai entender realmente o que estou relatando.
Assim que ocorreu o naufrágio do Ramco Cruzader em 2013 foi muito noticiado na mídia local e logo, começamos a nos mobilizar para conseguir a marcação das coordenadas com pescadores locais, pessoal da Marinha e outros parceiros no mar.
Nas primeiras semanas após o sinistro tentamos uma primeira busca só com base nas coordenadas divulgadas no "Aviso aos navegantes" publicado pela Marinha, tentativa esta que não tivemos sucesso e não encontramos nada, pois a marcação não era precisa e o estado agitado do mar não nos permitiu estender as buscas na pequena lancha "Baby", do mergulhador "Leozão", na qual fomos até a área, cerca de 35 Mn navegando a partir da cidade de Fortim-CE (aproximadamente 70 Km de navegação).
Em uma segunda tentativa em outubro daquele ano de 2013, ao chegarmos na área havia um enorme rebocador off shore tipo Supply, maior que o próprio Ramco exatamente em cima da marcação que tínhamos conseguido com pescadores parceiros. Quando estávamos começando a nos equipar o oficial no comando nos chamou pelo rádio no VHF 16 e informou que a área estava restrita a navegação e havia uma operação em andamento para reflutuar o Naufrágio e teríamos que nos retirar daquela área... assim fizemos e então seguimos para mergulhar noutro ponto ali próximo que chamamos de ninho dos Beijupirás? para não "perder"a viagem. E mais uma tentativa de mergulho no Ramco foi frustrada.
Passadas algumas semanas os pescadores nos informaram, para sorte da comunidade de mergulhadores de naufrágio, que a operação de resgatar o navio não teve sucesso e o Ramco permaneceu no fundo onde jaz até hoje.
Nossa expedição começou com conversas informais pelo whatsapp em meados de dezembro de 2015, quando Leozão começou a provocar a ideia de tentarmos novamente e para eu organizar uma equipe para outra operação e assim fomos amadurecendo a ideia no início do ano até fecharmos uma data em que eu poderia ir para Fortaleza e contar com apoio de um grupo de poucos mergulhadores experientes para registrar esse naufrágio.
 
Fechamos a equipe com nove mergulhadores:
Bricks - Como líder da expedição;
Martorano - meu dupla nos últimos anos e um dos Mergulhadores de Sidemount em Naufrágios mais safos que já conheci com a função de Cinegrafista e edição de imagens;
Nairo e Medeiros, ambos excelentes Dive Masters e Bombeiros Militares muito experientes não apenas nos mergulhos em Naufrágio off shore do Ceará mas também em situações resgate, sendo que desde que cheguei em Fortaleza em 2010 até hoje foram grandes parceiros nos mergulhos. Neste mergulho Nairo foi responsável em me ajudar com toda a Logística do Mergulho como na maioria de nossos mergulhos e Medeiros que integrou a equipe na ultima hora, fazendo captação de Imagens em fotos e vídeos.
George Almeida - Nosso Fotógrafo sub e Videomaker;
Evandro "Boião" nosso mergulhador "taifeiro" de bordo que garante sempre o melhor pirão de peixe após os mergulhos e está presente em praticamente todos os mergulhos ocorridos no Ceará.
André - Mergulhador Old Scholl e experiente remanescente da Operadora Netuno do meu grande amigo Xéu Torres, pioneiro no mergulho Cearense, e seu dupla Rodrigo "BB".
Leozão Nunes Maia - No comando da Lancha rápida Baby com a segunda equipe de mergulhadores para em uma eventual emergência e realizar um resgate rápido para terra.
A tripulação de nossa embarcação era composta pelos Mestres Ivan e Eliésio, nossos homens de confiança nos mergulhos do Ceará realizados no litoral Leste há anos. E o Mestre Xibel auxiliando como Marinheiro na lancha Baby.


 

 

A proa ainda com o nome da embarcação visível
 

O rebocador encontra-se emborcado
 
Pré Mergulho
Viajei de São Luis por 13 horas num carro cheio de tralha até Fortaleza na quinta feira antes do mergulho, pois nos mergulhos lá no CE temos que levar praticamente tudo e pensamos sempre no pior cenário pois o mar mesmo na época boa, é bruto. Também não existem barcos adaptados ou preparados para mergulho, são embarcações rústicas de pesca artesanal, do tipo traineira, então temos que levar literalmente de tudo, desde material de salvatagem e primeiros socorros até rancho para almoçar, lanchar e talvez até jantar a bordo, além de toda tralha de mergulho, foto, filmagem, cabos, garateias, boias e as vezes até ecobatímetros e chart plotters portáteis e por aí vai.
Nosso embarque saindo da barra do rio Jaguaribe no município de Fortim-CE, 160 km de distância de Fortaleza, estava marcada para 03:00 da madrugada de sábado 27 de fevereiro de 2016, sendo que apesar de ser muito mais distante sair de Fortim do que se saíssemos do município de Beberibe, há um embarque de material mais tranquilo em Fortim, em um cais abrigado no rio, pois já tivemos péssimas experiências embarcando material em praias usando apoio de "catraias", inclusive essas pequenas embarcações já emborcaram cheias de equipamentos e nos deram grandes prejuízos.
As 02:30 da manhã pontualmente mestres Ivan e Eliésio estavam atracando no píer combinado para embarcarmos o material e seguirmos até a marcação do naufrágio. Para estarmos todos no local na hora marcada, tivemos que sair de Fortaleza na noite anterior... selva!!!
Da busca à marcação
Durante a longa navegação nos esprememos nos minúsculos beliches da cabine tentando dormir um pouco para passar o tempo e também descansar antes do mergulho desconhecido que estava por vir, jogamos conversa fora e corricamos uma "rapala" (isca artificial) e o "Boião" até quase fisgou um dourado do mar que escapou da isca ao saltar para fora d'água.
Após aproximadamente seis horas e meia de navegação, informei ao Nairo que faltavam poucos minutos para marcação no GPS "zerar" e ir se equipando, pois ele seria o responsável pela primeira caída para encontrar o naufrágio, amarrar o cabo e se tudo estivesse ok, enviar um lift bag sinalizando que havia encontrado e poderíamos nos preparar pra descer.
Mestre Eliesio safou o cabo e o Nairo ficou de prontidão no aguardo enquanto eu e Mestre Ivan estávamos tentando equalizar as duas marcações nos GPS para uma caída certeira.
O mar estava correndo e a ondulação em torno de 2m vindo em vagas cheias sacolejavam muito o nosso barco.
Quando zeramos a marcação pedi pra mestre Ivan colocar a proa pro barlavento e buscaríamos a presença do naufrágio no ecobatímetro, e em poucos minutos a sonda acusou algo que só podia ser o naufrágio.
"Nairo, Água!", gritei ao lado da cabine de comando.
Nairão caiu naquele mar em fúria com o cabo de proa na mão e em poucos minutos chegou à superfície o lift bag que era o sinal enviado por ele que já estávamos amarrados ao naufrágio.
Por um momento estranhei a profundidade marcada na sonda, e achei que podia não estar certa, mas calei, acusava apenas 25m de profundidade na areia.
Nesse momento que o lift bag boiou subindo pelo cabo da amarra sinalizando que havíamos encontrado o Ramco, avistamos a lancha "Baby" no horizonte, vindo nos gás total, pontualmente com a segunda equipe de mergulhadores.
 
Do Mergulho
Quando a lancha Baby chegou, amarramos ela à nossa embarcação e logo nos preparamos todos para cairmos na água.
Quando o Ramco afundou havíamos previsto que estaria a uma profundidade em torno de 35m a 38m na areia pelas cartas náuticas e tendo como referência outros pontos próximos. Naquela segunda expedição que fomos obrigados a seguir para o "ninho dos beijupiras" que é relativamente próximo dali a profundidade chegava a 38m.
Antes de pegar estrada e viajar pra Fortaleza eu possuía um pouco de oxigênio em casa e preparei misturas nitrox de 30% em dois S-80 para o primeiro mergulho, acreditando que a profundidade seria máxima de 37m tendo 1.4 de ppO2 e preparei outros dois S-80 com Nitrox 28% para o segundo mergulho pois meu Oxigênio acabou. Também levei um cilindro de oxigênio puro para deixar debaixo do barco pendurado em um cabo de deco station aos 6m. Gosto de fazer mergulhos longos de sidemount em naufrágios, geralmente de mais de uma hora e muitas vezes descompressivos, mas ainda não tinha certeza da profundidade exata que encontraríamos então tentei ser o mais conservador possível e assim fazer dois mergulhos longos seguros.
Ao cair na água a visibilidade estava entre 30 e 35m, parece relato de mar caribenho, mas nos mergulhos distantes lá no Ceará é comum essa visibilidade, era possível visualizar o naufrágio da superfície e o fundo branco de areia bem nítido rodeando o Ramco. Um cenário impactante.

 



O casco ainda íntegro fechou a maior parte do acesso ao interior
 
Para nossa surpresa, a sonda estava certa e a profundidade máxima foi entre 27 e 28m, profundidade perfeita para mergulhos longos em naufrágio. Realizei dois mergulhos na configuração sidemount e deu pra fazer 1:17 no primeiro mergulho e 50 minutos em tempo de fundo no segundo, separados por 1:15 de intervalo, ou seja, explorei por cerca de duas horas o Ramco Crusader
A parte mais rasa fica na proa entre 15 e 16m, os detalhes estão no croqui elaborado pelo Luciano Andrade, que a exemplo do Maurício Carvalho é um dos melhores em elaborar croquis de naufrágios que conheço aqui no Brasil.
Cada um teve o seu perfil de mergulho e diferentes visões do naufrágio que podem ser observadas pelos vídeos realizados, eu infelizmente não filmei, mas vou relatar o que vi e assisti nos vídeos dos colegas.
 
Detalhes do Naufrágio
Nairo amarrou o cabo de descida nos enormes tubos de Kort, acima deles a profundidade é de 18 metros, os dois hélices principais que são muito valiosos, já foram retirados, mas o hélice auxiliar lateral da popa ainda está no local.
Naufrágio está emborcado e sua proa aponta para o Sul.
De sidemount é possível entrar nele pela Popa, entre o navio e a areia, se arrastando, em um enorme salão onde o convés principal transformou-se no teto, com os guinchos e aparelhos de trabalho do Supply e um enorme cenário de ponta cabeça bem iluminado pelas duas laterais.
O lado de boreste que está do lado esquerdo de quem vai sentido à proa há uma saída d'água ou porta ló que ainda está batendo e fazendo barulho durante o mergulho dá pra verificar nos vídeos.
A ancora tipo patente está dentro do escovém no boreste e no alto da proa fica a parte mais rasa do mergulho próxima a 15m onde há correntezas bem fortes.
Há uma rachadura no casco que nos intrigou e precisa ser melhor analisada e também uma chapa já se soltando do casco, que logo será outro ponto de entrada para o interior do naufrágio!
Pelo Bombordo, a penetração pela lateral entre a balaustrada e a areia é bem ampla como mostram as fotos e os vídeos e é uma penetração incrível com diversos itens interessantes e pequenas salas como casa de força, oficinas e depósito.
Também pelo Bombordo, sem conexão com esse grande salão que se formou do convés, há uma outra entrada pela parte externa de uma penetração bem técnica e estreita que batizei de "Passagem do Grifo" pois havia um enorme grifo por ali onde fiz a amarração primária da carretilha.

 

Sob o casco as penetrações dependem de técnica adequada
 

O convés virou o teto
 
Esse trecho não há registros de vídeo ou fotos, pois entrei solo e cabeei com a carretilha um circuito em forma de raquete. Lá dentro foi possível identificar um quarto devido ao que restou das camas, banheiros com as privadas no teto ao estilo "Itapajé -1943", cilindros de Oxigênio caídos e muitas peças ainda muito instáveis do casario que emborcou e depois foi esmagado quando o naufrágio se chocou com o leito marinho.
Alí é provável que ainda exista outras passagens e também há muito o que ser explorado, com possíveis passagens para outros andares mas cabe frisar que é um trecho bem técnico, onde só é possível entrar com configuração de mergulho técnico e de sidemount ao duplas de no máximo 13l pois as passagens são bem estreitas, sem nada de luz natural e ainda á muita coisa solta e desabando, complexo como uma caverna só que com possíveis desabamentos. Necessário dominar técnicas de mergulho overhead como técnicas de carretilhas, S-drill, mergulho ás cegas e etc pois é bem fácil "siltar" ali dentro, ou se perder nos labirintos escuros.
 

Penetração cuidadosa sob os destroços
 
Em muitos locais só é possível entrar de "no mount" (quando se desclipa os mosquetões inferiores dos cilindros de sidemount para passar em passagens bem pequenas, se arrastando com os cilindros apontados para frente do corpo), mas ainda há muito a ser descoberto ali pelos próximos mergulhos nas próximas décadas, afinal a exemplo do Naufrágio Macau que está desde 1961 no fundo e já fizemos dezenas de mergulhos, sempre encontramos um local novo para penetrar ou algum detalhe que nunca havíamos reparado e isso torna esses naufrágios oriundos de acidentes e tragédias tão interessantes e com uma infinidade de detalhes.
Conclusão:
Em resumo o Naufrágio do Rebocador de plataforma Supply " Ramco Cruzader" com seus 68 metros de comprimento entra para o Rol dos naufrágio Top no Brasil.
Por sua profundidade de 18 a 28 seria um naufrágio acessível a quaisquer mergulhadores avançados e perfeito para cursos de naufrágio + Nitrox, não fosse pela distância da costa e tempo gasto para chegar nele, fato que o tornará mais um naufrágio lendário do Ceará.
Essa operação contando do horário que saímos de Fortaleza até chegar de volta após a operação, foram 23 horas sendo destas praticamente 17 horas embarcados, não num live aboard, mas numa traineira de pesca de lagosta, então certamente posso afirmar que não será um naufrágio de operações comerciais e o "Ramco" a exemplo dos naufrágios do Pecém e do Eugene Thayer (Petroleiro do Acaraú) também entra para o rol de naufrágios cearenses que são desejados por muitos mergulhadores, mas são mergulhos raríssimos e especiais para poucos privilegiados que topam passar o "perrengue" e enfrentar a aventura de chegar até eles.
 

máquinasproapopa

Shipwreck WRECK WRAK EPAVE PECIO