O torpedeamento do Affonso Penna
Affonso Penna
A partir de 1909, com o incremento da navegação o Lloyd Brasileiro encomendou na Inglaterra três novos vapores de desenho semelhante ao do Rio de Janeiro e São Paulo. Eles receberam os nomes de Bahia, Minas Gerais e Pyrineus.
O Minas Gerais foi construído em 1910 nos estaleiros Workman Clark & Co. de Belfast na Irlanda do Norte. Apresentava 112,2 metros de comprimento, 14,8 metros de boca e 3.540 toneladas de deslocando.
Suas máquinas eram do tipo Triple Expansion Engine de 534 NHP, impulsionando um hélice e permitindo atingir 12 nós de velocidade máxima.
Com uma tripulação de 89 homens, esse navio misto transportava carga e 160 passageiros.
Foi lançado ao mar e incorporado ao Lloyd Brasileiro no mesmo ano com o nome de Minas Gerais. Em 1929 foi rebatizado como Affonso Penna, prestando serviços ao Lloyd em rotas regulares de Santos a Manaus.
O Minas Gerais do Lloyd Brasileiro que seria rebatizado de Affonso Penna
FICHA TÉCNICA
DADOS HISTÓRICOS
Nome do navio: Affonso Penna
Data do Naufrágio: 02.02.1943
Local: ao largo de Porto Seguro, BA.
Tipo de embarcação: paquete
Armador: Lloyd Brasileiro
Nacionalidade: brasileira
DADOS TÉCNICOS
Estaleiro: Workman Clark & Co., (Belfast – Irlanda do Norte).
Início da construção: 1910
Dimensões: comprimento: 112,2 metros – boca: 14,8 metros
Deslocamento: 3.540 toneladas
Material do casco: aço
Propulsão: a vapor
Tripulação: Tripulação / Passageiros: 89 tripulantes e 153 Passageiros
A Segunda Grande Guerra
Durante os primeiros anos da Segunda Guerra Mundial o conflito parecia apenas um leve eco dos acontecimentos da Europa. Somente alguns episódios isolados e esporádicos como os afundamentos em 1939 e 1941 dos navios alemães encouraçado Graf Spee no Uruguai e o Wakama ao largo de Búzios, RJ. lembravam que o país estava à margem de um grande conflito.
Porém, em 1942 essa confortável situação mudaria. Em dezembro de 1941, com o ataque do Japão a Pearl Harbor, os Estados Unidos entram na guerra, contra o pacto tripartite do eixo, do qual faziam parte a Alemanha, Itália e o Japão.
Em dezembro de 1941, Doenitz, o comandante da Marinha de Hitler, decide utilizar os U-boats para dar início a uma campanha de ataque ao tráfego marítimo comercial ao longo da costa leste dos Estados Unidos, visando cortar as linhas de suprimentos.
Esta campanha, conhecida como Paukenschlag (batida de tambor), provocaria a partir de janeiro de 1942 a perda de milhões de toneladas brutas aos aliados.
Diante da flagrante agressão a um país pan-americano, as demais nações do continente não podiam ficar passivas. Em janeiro de 1942, na cidade do Rio de Janeiro, é realizada uma reunião com os países da América. Devido à resolução Nº 5 desta reunião, o governo brasileiro decide cortar relações diplomáticas e comerciais com as nações do eixo; decisão que fortalecia a ideia de uma futura declaração de guerra. Além disso, os Estados Unidos pressionava e oferecia vantagens para que o Brasil permitisse a instalação de bases americanas em território brasileiro.
Em fevereiro de 1942, o governo adota as primeiras medidas preventivas de defesa. São tomadas precaução defensivas ao longo da costa do país e são convocados para serviço ativo os reservistas da Marinha com menos de 40 anos de idade.
A operação Paukenschlag de Doenitz, teria consequências também para o Brasil. De fevereiro a julho de 1942, 12 navios mercantes brasileiros foram afundados ao longo das costas das Américas por submarinos Italianos, mas na sua maioria alemães. Entre eles estavam o: Buarque (14.02 ), Olinda (18.02), Cabedello (25.02), Arabutã (07.03), Cayru (08.03), Parnahyba (01.05), Gonçalves Dias (24.05), Alegrete (01.06), Pedrinhas (26.06), Tamandaré (26.07), Piave (28.07) e Barbacena (28.07), Antônico (28.09) e o Apalóide (22.11).
Embora muito se fale sobre o ataque dos submarinos alemães durante a Segunda Guerra Mundial, o primeiro torpedeamento confirmado, em águas que costeavam o Brasil, coube a um submarino italiano.
Em 25 de fevereiro de 1942 o submarino italiano Tazzoli torpedeou o cargueiro inglês Queen City, ao largo da costa do Maranhão, dando início a uma série de ataques.
Outras atividades dos submarinos italianos, que causaram afundamentos na costa brasileira , também foram registrados.
Barbarigo – Afonso Pena, Chalbury, Monte Igueldo, Stag Hound
Calvi – Balkis, Ben Brush, Eugene V. R. Thayner, Stavanca Calcuta
Tazzoli – Dona Aurora, Empire hawk, Ombilin
Os navios brasileiros seguiam as regras impostas pelo Estado Maior da Marinha, onde se recomendava os comboios e caso não fosse possível, a rota deveria ser bem próximo da costa e apenas com as luzes de navegação acesas.
Muitos dos navios brasileiros até 1944 navegavam a escoteiro (sozinhos), já que as baixas velocidade e o excesso de fumaça deixava esses navios fora dos comboios protegidos e organizados pela Marinha americanas, que agora já operava em nosso litoral.
Nos dias 15, 16 e 17 de julho o U-507 atacou e afundou na costa de Sergipe e Bahia, os mercantes Baependy, Araraquara, Anibal Benévolo, Itagiba, Arará, e a barca Jacira, causando a morte de 551 brasileiros e perdas que totalizaram mais de 14.000 toneladas brutas.
A partir daí, as articulações políticas americanas, a pressão da imprensa e a reação popular que foi a rua pedir guerra, levaram o Presidente Getúlio Vargas, no dia 22 de agosto de 1942, a declarar guerra aos países do Eixo.
O Torpedeamento
O Brasil agora era um país em guerra, mas no início de 1943 as autoridades marítimas acreditavam que as medidas de proteção e a formação dos comboios resolveriam os problemas dos ataques dos U-Boats em nosso litoral. Até mesmo um aviso da Quarta esquadra americana de que “Nossa costa estava limpa” foi emitido.
Porém, isso não resolveu os problemas com os lentos e fumacentos navios da frota nacional, os capitães também não levaram em consideração que nos primeiros dias de março, quatro cargueiros estrangeiros (dois norte-americanos, um holandês e um sueco) foram atacados na mesma área.
O Affonso Penna partiu de Recife (PE) para o Rio de Janeiro sob o comando do Capitão de Longo Curso Euclides de Almeida Basílio e tripulado por 89 homens. Fazia arte de um comboio de cinco navios de cinco navios (Recôncavo, Nortelóide, Itapagé e um cargueiro Inglês) protegidos pelo Cruzador Bahia, pela Corveta Cabedelo e pelo Caça Submarino Gurupi.
No final da tarde, encontrando um comboio com 18 navios que vinha de Trinidad protegidos por navios americanos e tudo corria. Subitamente um dos caça minas que mudou o rumo e algum tempo depois lançou cargas de profundidade. Algum tempo depois a rotina foi restabelecida e o Affonso Pena encontrou um segundo comboio com 30 embarcações.
Porém cerca de l h da madrugada do dia 19 de março, alguns navios, petroleiros e belonaves americanas tomaram rumo para a África enquanto os navios de guerra brasileiros e alguns cargueiros seguiram para Salvador.
Nesse momento, talvez por um erro na sinalização, o Affonso Penna acabou se desgarrando. Com baixo estoque de carvão o comandante decidiu deixar os sete navios e seguir a escoteiro por uma rota tradicional e por isso não aconselhada, diretamente para o Rio de Janeiro.
Os capitães brasileiros inda não tinham experiência de navegar agrupados, com luzes apagadas e mudanças de rumo frequentes, táticas clássicas nos comboios do período e possivelmente o desvio de alguns navios provocou a mudança fatal de rota do Afonso Penna.
Às 19:10 horas dia 02, o paquete do Lloyd passava ao largo da costa da Bahia, na posição de Latitude 16º 10′ sul e Longitude 35º 58′ oeste, quando segundo o 1º oficial, um estrondo seco, forte e violento, sacudiu todo o navio.O Affonso Penna foi atingido a boreste na altura do porão dois e da carvoaria por um torpedo do submarino italiano Barbarigo, sob o comando do Capitão-Tenente Roberto Rigoli, o mesmo que a avia atacado o cargueiro Comandante Lira em 18.05.1942 e o Monte Igualdo (04.02.1943) e o Stag Hound (25.03.1943).
O navio afundou de proa em menos de 15 minutos, as máquinas continuavam a funcionar enquanto os tripulantes lutavam para arriar as baleeiras, que acabaram deslizando ao longo do costado do barco até chegar aos hélices. Infelizmente os hélices destroçaram uma das baleeiras matando alguns tripulantes e passageiros.
Uma única baleeira estava em estado se uso e os náufragos agarraram-se a ela e aos destroços que flutuavamSegundo algumas testemunhas, logo depois do ataque o submarino Barbarigo emergiu próximo ao Afonso Penna que agonizava e disparou dois tiros de canhão contra cabine de comando do navio. O objetivo seria impedir a comunicação telegráfica informando a posição do submarino. A explosão da munição provocou a morte do segundo Radiotelegrafista Pedro Mora Cabral que transmitia o sinal de socorro.
O submarino italiano circulou entre os destroços interrogando o grupo de náufragos, da baleeira sobre o Midosi, cargueiro do Lloyde brasileiro que trazia dos Estados Unidos uma carga de material militar e que deveria estar em rota por nosso litoral.
A impressa alardeou o fato, reforçando a tese da quinta coluna, que mostra que a espionagem funcionava em nosso país.
No jornal A Noite, um dos passageiros declarou “o submarino na superfície mostrava o comandante no passadiço com uniforme caqui, botas pretas e quepe branco, com as insígnias da Marinha de Guerra Italiana” ainda segundo o passageiro “depois de se recusar a socorrer os passageiros e manter vigilância com a metralhadora o oficial italiano declarou Isto é a guerra”.
Utilizando apenas uma baleeira oito tripulantes e um passageiro, após 62 horas no mar avistaram Monte Pascoal, sendo socorridos por um barco de pesca e aportaram em Porto Seguro (BA), outros foram recolhidos no dia seguinte pelo petroleiro norte-americano Tennessee, que rumava para o Rio de Janeiro. Existem registros de que, os tripulantes precisaram afastar tubarões a tiros de canhão.
Ainda a lancha brasileira Guandarense 8 recolheu alguns náufragos.
A bordo estavam 242 pessoas e o Affonso Penna levou para o fundo 125 homens, 33 da tripulação e 92 passageiros, uma das maiores perdas navais do Brasil por ação inimiga. Ao longo de 1943, mais seis navios mercantes brasileiros foram afundados.