Torpedeamento do Vital de Oliveira
Histórico
Construído nos estaleiros da companhia Ailsa Shipbuilding, na Escócia em 1910 foi lançado com o nome de Itaúba (um tipo de árvore ou madeira), para ser um dos famosos ITAs, como eram conhecidos os navios da Companhia Nacional de Navegação Costeira. Esses paquetes faziam o transporte de cabotagem de passageiros e cargas, na primeira metade do século 20.
Todos os navios originais tinham nomes em tupi-guarani iniciados por ITA (pedra): Itaberá, Itagiba, Itaguassu, Itahité, Itaimbé, Itaipu, Itajubá, Itanagé, Itapagé, Itapé, Itapema, Itapuca, Itapuhy, Itapura, Itaquara, Itaquatiá, Itaquera, Itaquicé, Itassucê, Itatinga, Itaúba.
Posteriormente foi incorporada a companhia do Lloyde Nacional, que traziam tradicionalmente o nome ARA, como o Araponga, naufragado em 1943 próximo a ilha Queimada Grande, SP. devido a um choque com o navio Vênus.
O Itaúba possuía 82,3 metros de comprimento, 12,3 metros de boca e 4,3 metros de calado, deslocando 1.737 toneladas. Estava equipado com duas máquinas a vapor de tripla expansão produzindo 540 Hp, elas impulsionavam dois hélices, permitindo uma velocidade de 9 nós.
Apresentava três porões amplos com paus de carga e acomodações para passageiros no castelo central.
Símbolo da Companhia Nacional de Navegação Costeira, ostentado na chaminé dos navios. O emblema da companhia foi localizado no naufrágio do Araponga (confira)
DADOS BÁSICOS
Nome do navio: Vital de Oliveira
Data do afundamento: 26.09.1943
LOCALIZAÇÃO
Local: Entre Cabo de São Thomé e Quissamã
UF: RJ. – País: Brasil
Posição: 25 milhas do farol de São Thomé
Latitude: 22º 34′ sul e Longitude: 041º 08′ oeste
Profundidade mínima: 50 metros
Profundidade máxima: 55 metros
MOTIVO DO AFUNDAMENTO: torpedeamento pelo U-861
CONDIÇÕES ATUAIS:
DADOS TÉCNICOS
Nacionalidade: Brasileira
Ano de Fabricação: 1910
Estaleiro: Ailsa Shipbuilding Company de Troon (Escócia)
Armador: Marinha do Brasil
Comprimento: 82,3 metros
Boca: 12,3 metros
Deslocamento: 1.737 toneladas
Tipo de embarcação: paquete
Material do casco: aço
Propulsão: 2 hélices
Carga: material bélico
Na Marinha do Brasil
Em 1919, o Itaúba foi requisitado pela Marinha do Brasil para servir como transporte da força naval enviada à baía de Assunção destinada a garantir a livre navegação do rio Paraguai, durante a guerra civil do Paraguai de 1911-1912.
Em 29 de outubro de 1931, ele foi incorporado à Marinha de Guerra brasileira, juntamente com os vapores Itajubá e Itapema e em dezembro de 1932 foi rebatizado como Vital de Oliveira, em homenagem ao Capitão de fragata Manuel Antônio Vital de Oliveira, morto em um bombardeio ao Forte de Curupaiti, em 1867, quando comandava o Monitor Encouraçado Silvado, na Guerra do Paraguai.
Na Marinha, atuou como navio de instrução, faroleiro, hidrográfico e navio auxiliar. Com o início da guerra foi armado com 2 canhões de 40 e 47 mm.
A Segunda Guerra para o Brasil
Durante os primeiros anos da Segunda Guerra Mundial o conflito parecia apenas um leve eco dos acontecimentos da Europa. Apenas alguns episódios isolados e esporádicos como os afundamentos em 1939 e 1941 dos navios alemães encouraçado GrafSpee no Uruguai e o Wakama ao largo de Búzios, RJ. lembravam que o país estava à margem de um grande conflito.
Porém em 1942 essa confortável situação mudaria. Em dezembro de 1941, com o ataque do Japão a Pearl Harbor, os Estados Unidos entram na guerra, contra o pacto tripartite do eixo, do qual faziam parte a Alemanha, Itália e o Japão.
Em dezembro de 1941, Doenitz, o comandante da Marinha de Hitler, decide utilizar os U-boats para dar início a uma campanha de ataque ao tráfego marítimo comercial ao longo da costa leste dos Estados Unidos, visando cortar as linhas de suprimentos.
Esta campanha, conhecida como Paukenschlag, provocaria a partir de janeiro de 1942 a perda de milhões de toneladas brutas aos aliados.
Diante da flagrante agressão a um país pan-americano, as demais nações do continente não podiam ficar passivas. Em janeiro de 1942, na cidade do Rio de Janeiro, é realizada uma reunião com os países da América. Devido à resolução cinco desta reunião, o governo brasileiro decide cortar relações diplomáticas e comerciais com as nações do eixo; decisão que fortalecia a ideia de uma futura declaração de guerra. Além disso, os Estados Unidos pressionava e oferecia vantagens para que o Brasil permitisse a instalação de bases americanas em território brasileiro.
Em fevereiro de 1942, o governo adota as primeiras medidas preventivas de defesa do país. São tomadas medidas de precaução defensiva ao longo da costa do país e são convocados para serviço ativo os reservistas da Marinha com menos de 40 anos de idade.
A operação Paukenschlag de Doenitz, teria consequências também para o Brasil. De fevereiro a julho de 1942, 12 navios mercantes brasileiros foram afundados ao longo das costas das Américas por submarinos na sua maioria alemães, mas também Italianos. Entre eles estavam o: Buarque (14.02 ), Olinda (18.02 ), Cabedello (25.02 ), Arabutã (07.03), Cayru (08.03), Parnahyba (01.05), Gonçalves Dias (24.05), Alegrete (01.06), Pedrinhas (26.06), Paracurí (28.06), Tamandaré (26.07), Piave (28.07), Barbacena (28.07), Antônico (22.09) e Apalóide (15.11).
Esses afundamentos e as subsequentes manifestações da população, que pediam guerra, culminaram em agosto de 1942, com a declaração de guerra às potências do Eixo pelo governo brasileiro.
O Naufrágio
Até 1944 as unidades da Marinha do Brasil tinha escapado do ataque direto das forças do eixo, apenas os mercantes estrangeiros e alguns nacionais tinham sido torpedeados perto do litoral. O N.A. Vital de Oliveira seria o único navio da marinha do Brasil afundado em combate. As duas outras perdas seriam a Corveta Camaquã em julho de 1944, devido a um golpe de mar em frente ao litoral de Recife e o Cruzador Bahia, que explodiu em julho de 1945 durante um exercício de tiro no meio do Atlântico.
O Vital de Oliveira partiu no dia 15 de julho do porto de Natal comandado pelo Capitão-de-Fragata João Batista de Medeiros Guimarães Roxo, transportando 245 militares, além dos tripulantes praças da marinha para o Rio de Janeiro, fez escalas em Cabedelo, Recife, Salvador e Vitória.
No dia 19 de julho de 1944 o Vital de Oliveira largou de Vitória, ES. às 10 horas em direção ao Rio de Janeiro, escoltado pelo caça submarino Javarí. O tempo era bom e o mar estava calmo, condições que favoreciam a ação dos submarinos que podiam visualizar um navio a maior distância. Ao cair da noite, foi ordenado um black-out (navegação as escuras).
Às 20 horas, o navio passava a 25 milhas (45 km) da costa norte do estado do Rio de Janeiro, entre Campos e Quissamã, a posição era 22° 29′ S e 41° 09′ W e foi marcado o Farol de São Thomé (RJ) pelo través de boreste. O navio seguia com velocidade de 10 nós (10 milhas por hora) e os passageiros estavam recolhidos aos alojamentos. Neste momento, não havia mais contato visual entre o Vital de Oliveira e o Javari, já que os dois navios navegavam apagados.
subitamente sacudiu a popa do navio.As 23:55 hs subitamente um impacto de torpedo do submarino alemão U-861 (tipo IXD2) provocou uma grande explosão na popa do Vital de Oliveira. O mastro de ré tombou destruindo parte do convés, retorcendo turcos e esmagando alguns escaleres o que prejudicaria o resgate.
O comandante deu o sinal de postos de combate, o canhão de proa foi guarnecido e foram lançados foguetes de sinalização e comunicado o Javarí.
Perfil de Side scan do naufrágio identificado como sendo o Vital de Oliveira – perfil consistente com o tipo de embarcação de um ITA
Caça submarino Javari – Na Marinha dos Estados Unidos era o SC-763, na Marinha do Brasil recebeu o indicativo CS-51 e posteriormente J-1.
Um grande rombo no costado de bombordo deixava entrar água em grande quantidade, invadindo as cobertas e porões. O navio afundava rápido de popa e foi dada ordem de abandonar o navio.
Em menos de 5 minutos o Vital de Oliveira deixava a superfície. Poucos escaleres e balsas foram arriadas e muitos homens atiraram-se as água frias da região, procurando salvar-se nos destroços do navio que flutuavam.Os náufragos, inclusive o comandante Guimarães, passaram a noite dentro das baleeiras e escaleres ou agarrados a destroços que flutuavam.
Quando o dia amanheceu, várias dessas baleeiras dirigiram-se para costa, que já podia ser vislumbrada ao longe.
Por volta das 9 horas da manhã do dia 20, apareceu no horizonte o barco de pesca Guanabara que circulou pela região recolhendo os náufragos que se achavam espalhados sobre os destroços.
Algumas horas depois encostou no local o CS Javarí que recolheu os feridos rumando imediatamente para o Rio de Janeiro.
Na noite do dia 20 chegou ao local, despachado do Rio de Janeiro, o Contratorpedeiro Mariz e Barros que recolheu os náufragos do Guanabara e demais baleeiras, regressando ao Rio de Janeiro, onde aportou com 82 sobreviventes.
Ele foi o último navio torpedeado no litoral brasileiro, mas um duro golpe para a marinha, já que dos 245 passageiros e tripulantes o ataque vitimou 99 militares entre oficiais e praças.
A localização
A primeira informação que chegou até mim do Vital de Oliveira foi de que a Petrobrás havia identificado em agosto de 1999 um naufrágio nessa posição durante os trabalhos de sondagem para o posicionamento de ductos e a profundidade dos destroços seria de 42 metros.
Por volta de 2020 dois mergulhadores entraram em contato comigo por E-mail informando a localização do navio, mas sem dar detalhes ou informações mais aprofundadas.
Em julho de 2024 foi anunciada na imprensa a descoberta do navio. Segundo as reportagens o Vital de Oliveira havia sido localizado por acaso por mergulhadores, os irmãos José Luiz e Everaldo Pompermayer Meriguete e Domingos Afonso Jório que foram ao local soltar uma rede de pesca que havia se prendido nos destroços. Um dos mergulhadores ao descer, deparou-se com um canhão.
Finalmente em 30.01.2025 a marinha informou ter localizado os destroços do N.A. Vital Oliveira a cerca de 55 metros de profundidade a 25 milhas do Farol de São Thome. A localização ocorreu através de um Side scan de varredura lateral do navio de pesquisa Oceanográfico Vital de Oliveira da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN).
Desde então, as informações apresentadas na grande mídia não apresentam evidências robustas dessa identificação.
Perfil de side scan do N.A. Vital de Oliveira possivelmente localizado pelo navio hidrográfico Vital de Oliveira da (DHN). Navio batizado em homenagem ao navio e homens perdidos em combate durante a segunda guerra – honra aos marinheiros e a Marinha do Brasil, que lutaram na defesa de nosso litoral e do comércio do país, contra uma agressão externa não provocada.
Aguardando e torcendo por mais evidências positivas
Ainda não estou totalmente confiante nessa identificação, embora torça para que ocorre brevemente.
Devemos considerar que mergulhadores nas escuras e frias águas da região, mergulhando a cinquenta meros de profundidade respirando ar, podem ter sido fortemente influenciados pela narcose na suposta identificação de um canhão.
Somando-se a isso, embora o perfil do side scan seja compatível com o Vital de Oliveira, que era um ITA (Itaúba), é importante lembrar que este navio apresentava um perfil bastante comum para a época e está afundado em uma das rotas mais frequentada pelos navios numa posição onde existem vários registros de naufrágios não localizados e outros não identificados mas registrados nas cartas náuticas (confira carta Nº 1600 – DHN).
O simples perfil, com medidas do side scan, não comprovam a identidade dos destroços.
Torcemos para que novos indícios possam comprovar de forma inequívoca a identidade do Vital de Oliveira. Importante descoberta de um momento único da história trágico marítima brasileira e não mais um erro de identificação de naufrágios, como tantos outros que já ocorreram em nosso litoral e que deram muito trabalho para serem desfeitos.
(Maurício Carvalho – 2025)
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