VAPORZINHO DE ITAPUÃ

Sumário

Pesquisa e Texto: Lázsló Mocsari
Fotos: Roberto Costa Pinto

Histórico

Porto de Cachoeira (Recôncavo baiano) entre o final do século XIX e início do século XX

No contexto marítimo de Salvador, Bahia, durante o século XIX e início do século XX, pequenas embarcações a vapor de cerca de 15 metros desempenhavam papéis fundamentais, adaptados às condições específicas da Baía de Todos os Santos e das rotas costeiras.
Essas embarcações, conhecidas como vapores, lanchas a vapor ou pequenos vapores, operavam em águas abrigadas ou próximas à costa, devido ao seu tamanho compacto e calado raso (1,5 – 3 metros), ideal para navegar na baía e em áreas portuárias.
Seus usos refletiam as demandas econômicas, sociais e logísticas de Salvador, um dos principais portos do Brasil na época, conhecido pelo comércio de açúcar, tabaco, cacau e café, além da intensa atividade marítima.

Dados básicos

Nome do navio: Desconhecido

Dados de localização

Local: Salvador
UF: BA.
País: Brasil
Posição: a 2 NM (milhas náuticas) da praia de Itapuã
Latitude: 12° 58.757′ sul
Longitude: 038° 22.069’ oeste
Profundidade mínima: 38 metros
Profundidade máxima: 40 metros
Condições atuais: desmantelada

Dados técnicos

Nacionalidade: brasileira
Deslocamento: entre 25 e 50 toneladas
Comprimento: 15 metros
Boca: 4 metros
Tipo de embarcação: vapor de serviço
Material do casco: Ferro
Propulsão: motor a vapor de 1 estágio

Descrição

O vaporzinho de Itapuã foi encontrado por pescadores por volta da primeira metade dos anos 2000, situado a cerca de 2 milhas náuticas da famosa praia de Itapuã, imortalizada nos versos de Vinícius de Moraes e Toquinho (“Tarde em Itapuã”). Trata-se de uma embarcação pequena, com aproximadamente 15 metros de comprimento, movida a vapor, que hoje repousa sobre um fundo de rodolitos a exatamente 40 metros de profundidade.
A embarcação afundou em posição de navegação, com a proa apontando para a terra, o que sugere que, durante o naufrágio, a tripulação tentou levá-la à praia.
Seu casco está quase totalmente destruído, com os bordos abertos e assoreados. A proa, no entanto, ainda se mantém erguida, preservando seu formato típico. A caldeira, a máquina a vapor, o eixo e a hélice permanecem praticamente intactos, assim como as tubulações que conectam a caldeira ao motor. Contudo, devido ao tempo, esses componentes estão encrustados pela vida marinha. A integridade da caldeira permite descartar uma explosão como causa do afundamento, um acidente que não era incomum entre os séculos XIX e início do século XX, quando os padrões de engenharia e segurança ainda não eram rigorosos.


Vista panorâmica em  primeiro plano da proa a 40 metros –  Bico de proa em destaque


Vista em fotomontagem do vaporzinho de Itapuã  –  máquina a vapor (compare com o modelo abaixo)

     
Condição atual (2023) do Vaporzinho de Itapuã . Mostrando a caldeira, máquinas, parte da chaminé e o eixo – Máquina a vapor semelhante a do Vaporzinho de Itapuã.

Pesquisas

Possível emprego do Vaporzinho de Itapuã

  1. Lancha a vapor semelhante ao que seria o Vaporzinho

    Transporte de Passageiros na Baía de Todos os Santos
    Essas embarcações conectavam Salvador a cidades e vilas no entorno da Baía de Todos os Santos, como Itaparica, Maragogipe, São Félix, Cachoeira, Jaguaripe e Nazaré das Farinhas. Eram usadas para transporte regular de passageiros, incluindo comerciantes, trabalhadores e viajantes, em rotas curtas.
    A Baía de Todos os Santos, com suas águas relativamente calmas e extensas (segunda maior baía do mundo), era ideal para essas lanchas a vapor. Elas complementavam saveiros (embarcações à vela) e ofereciam maior pontualidade, independentemente de ventos ou marés.
    Vapores como os operados pela Companhia de Navegação a Vapor Baiana (fundada em 1839) e suas antecessoras,
    como Companhia Bonfim e Companhia Santa Cruz faziam trajetos diários entre Salvador e Itaparica, transportando passageiros.

    2.Transporte de Cargas Leves e Correio

    Carregavam mercadorias de alto valor ou perecíveis, como tabaco, cacau, açúcar e produtos manufaturados, entre o porto de Salvador e cidades costeiras próximas, como Ilhéus ou Valença. Também transportavam correspondências oficiais e jornais, vitais para a comunicação.
    O porto de Salvador era um hub para exportação de produtos agrícolas da Bahia. Pequenos vapores transportavam cargas menores diretamente para armazéns ou navios maiores ancorados na baía, evitando longos trajetos terrestres.
    A vantagem era o acesso a cais pequenos e rapidez na entrega, reduzindo perdas de produtos sensíveis.
    Registros de 1860 – 1880 mencionam vapores de 15 -20 metros usados para levar cacau do Recôncavo Baiano (ex.: Cachoeira) ao porto de Salvador, onde era transferido para transatlânticos rumo à Europa.

    3. Reboque e Apoio Portuário

    Atuavam como rebocadores para posicionar navios maiores (como veleiros ou vapor es transoceânicos) em cais ou áreas de carga/descarga no porto de Salvador. Também moviam barcaças do tipo alvarengas
    com produtos pesados, como fardos de algodão ou madeira.
    O porto de Salvador, com seus molhes (ex.: Cais Dourado), tinha tráfego intenso, mas muitas áreas eram rasas.
    Vapores pequenos manobravam com precisão, guiando navios ou transportando cargas entre o porto e a Cidade Baixa.
    Vapores de apoio eram comuns na década de 1870, quando o porto de Salvador modernizou -se com a construção de novos cais, exigindo rebocadores ágeis para logística.
    Estes vapores pequenos tinham potência para reboque e capacidade de operar em áreas congestionadas do porto.

    4. Fiscalização e Alfândega

    Eram usados pela alfândega ou Marinha para patrulhar a Baía de Todos os Santos, inspecionar navios e combater contrabando de produtos como tabaco ou escravizados (após a Lei Eusébio de Queirós, 1850).
    Como principal porto do Nordeste, Salvador era alvo de contrabando. Pequenos vapores patrulhavam a entrada da baía e rios próximos, como o Paraguaçu, para verificar cargas.
    Em 1850 – 1860, a Marinha Imperial usava vapores compactos (ex.: tipo Dom Pedro II, embora maiores) para fiscalização, mas modelos menores, de 15 metros, eram comuns para tarefas rápidas.
    A vantagem das embarcações menores era a manobrabilidade e baixo custo, com tripulações pequenas (4 – 8 pessoas).

    5. Lazer e Transporte de Elite
    Vapores como este eram alugados para passeios turísticos ou transporte de elites (como fazendeiros e autoridades) pela Baía de Todos os Santos, visitando ilhas ou praias. A baía, com sua beleza cênica, atraía a burguesia baiana para passeios recreativos. Vapores decorados, com cabines confortáveis, eram símbolos de modernidade. Nos anos 1880, eventos sociais na baía incluíam excursões a vapor para Itaparica, mencionadas em jornais da época como o Alabama. Ofereciam conforto e status, com a possibilidade de paradas em locais turísticos.

 
László apontando para a máquina a vapor – a caldeira vista de bombordo 

 
A caldeira vista de bombordo om a antepara de proteção, a máquina a vapor e saída do eixo

Contexto Histórico e Técnico
  • Combustível: Na Bahia, esses vapores usavam inicialmente carvão importado, mas logo passaram a lenha local (abundante no Recôncavo), reduzindo custos. A caldeira ocupava espaço significativo, limitando a carga.
  • Construção: Muitos eram importados da Inglaterra ou construídos localmente em estaleiros como o de Salvador ou Cachoeira, com cascos de madeira ou ferro e rodas de pás (mais comuns que hélices até 1880).
  • Declínio: A partir de 1900, motores a diesel começaram a substituir o vapor, sendo mais eficientes e baratos. Ainda assim, vapores pequenos operaram na Bahia até o início do século XX.
  • A Companhia de Navegação a Vapor Baiana (1839 – 1900) foi pioneira na introdução de vapores na Bahia, inspirada por modelos europeus. Pequenos vapores de 15 metros eram ideais para a baía, com profundidade média de 10 metros.


Vista frontal da caldeira, onde pode-se ver a boca de alimentação – Vista da popa, onde evidencia -se o eixo de propulsão


Vista da popa ja bastante assoreada, onde evidencia -se o eixo de propulsão – Seta branca: leme e seta vermelha: ponta de uma das pás da hélice


Vídeos do Vaporzinho de Itapuã
László Mocsari
Video 2013
Video 2024

 

 

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