Mais um dos vapores do Lloyd vai ao fundo
31.07.1943 - Mais um ataque no litoral da Bahia
O Bagé
Na primeira década do século XX cerca de 600 milhões de imigrantes viajaram para o Brasil, Uruguai ou Argentina, com isso criou-se uma enorme demanda por paquetes para a linha da América do sul. Em resposta, a empresa Norddeutscher Lloyd (N.D.L.) decidiu, em 1912, pela construção de quatro novos de paquetes mistos.
Os dois primeiros foram construídos entre 1912 e 1913 nos estaleiros Bremen Vulcan de Vegesack na Alemanha e lançados ao mar com os nomes de Sierra Nevada e o Sierra Cordoba.
Na viagem inaugural em 1913, o Sierra Nevada cruzou de Bremen a Buenos Aires com escalas intermediárias em portos do Brasil.
Os vapores apresentavam 133,8 metros de comprimento, 17,5 metros de boca.
Suas máquinas a vapor eram do tipo Quadruple Expantion Engine de 600 NHP, com dois hélices que impulsionavam o paquete a até 13 nós.
Com uma tripulação de 108 homens podia acomodar, além de carga, até 200 passageiros em 3 classes.
O Bagé ainda como Sierra Nevada da companhia alemã Norddeutscher Lloyd
Em setembro de 1914, logo após o início dos conflitos da 1ª Guerra Mundial na Europa o Sierra Nevada chegou a Recife, onde permaneceu abrigado para evitar o ataque ou apreensão por forças da Inglaterra e França. Em resposta a pressões internacionais e aos ataques de navios brasileiros em 01 de junho de 1917 o governo brasileiro apreendeu um total de 34 vapores alemães, entre eles estavam o Baependy e o Sierra Nevada. Os dois navios foram fretados ao governo francês, embora navegando com a bandeira brasileira. Em 1930, o Brasil tornou-se definitivamente o proprietário de sete desses vapores, como compensação pelos prejuízos de guerra e os navios foram transferidos ao Lloyde Brasileiro.
Eram navios velhos e maltratados que na frota nacional foram rebatizados de Baependy, Campos Salles, Santos, Petrópolis, Pernambuco, Belgrado e Bagé (Ex. Sierra Nevada). Em 1937 foi cogitada e anunciada a troca de nome do navio para Pedro Ernesto, mas não conhecemos o motivo da desistência desse processo.
Entre 1922 e 1941 era o maior navio da frota do Lloyd, cumprindo oito viagens de serviço de passageiros e carga entre o Brasil e a Europa.
FICHA TÉCNICA
DADOS HISTÓRICOS
Nome do navio: Bagé
Data do Naufrágio: 31.07.1943
Local: Em frente a foz do rio Real, BA.
Tipo de embarcação: paquete
Armador: Lloyde Brasileiro
Nacionalidade: brasileira
DADOS TÉCNICOS
Estaleiro: Akres Merk Vulcan Werke Stettin (Bremen – Alemanha)
Início da construção: 1912
Dimensões: comprimento: 133,8 metros – boca: 17,5 metros
Deslocamento: 8.235 toneladas
Máquinas: tipo Quadruple Expantion Engine, 600 NHP, 13 nós
Tripulação: 89 tripulantes e 153 Passageiros
Carga: 13.000 toneladas
A Segunda Grande Guerra
Durante os primeiros anos da Segunda Guerra Mundial o conflito parecia apenas um leve eco dos acontecimentos da Europa. Somente alguns episódios isolados e esporádicos como os afundamentos em 1939 e 1941 dos navios alemães encouraçado Graf Spee no Uruguai e o Wakama ao largo de Búzios, RJ. lembravam que o país estava à margem de um grande conflito.
Porém, em 1942 essa confortável situação mudaria. Em dezembro de 1941, com o ataque do Japão a Pearl Harbor, os Estados Unidos entram na guerra, contra o pacto tripartite do eixo, do qual faziam parte a Alemanha, Itália e o Japão.
Em dezembro de 1941, Doenitz, o comandante da Marinha de Hitler, decide utilizar os U-boats para dar início a uma campanha de ataque ao tráfego marítimo comercial ao longo da costa leste dos Estados Unidos, visando cortar as linhas de suprimentos.
Esta campanha, conhecida como Paukenschlag (batida de tambor), provocaria a partir de janeiro de 1942 a perda de milhões de toneladas brutas aos aliados.
Diante da flagrante agressão a um país pan-americano, as demais nações do continente não podiam ficar passivas. Em janeiro de 1942, na cidade do Rio de Janeiro, é realizada uma reunião com os países da América. Devido à resolução Nº 5 desta reunião, o governo brasileiro decide cortar relações diplomáticas e comerciais com as nações do eixo; decisão que fortalecia a ideia de uma futura declaração de guerra. Além disso, os Estados Unidos pressionava e oferecia vantagens para que o Brasil permitisse a instalação de bases americanas em território brasileiro.
Em fevereiro de 1942, o governo adota as primeiras medidas preventivas de defesa. São tomadas precaução defensivas ao longo da costa do país e são convocados para serviço ativo os reservistas da Marinha com menos de 40 anos de idade.
A operação Paukenschlag de Doenitz, teria consequências também para o Brasil. De fevereiro a julho de 1942, 12 navios mercantes brasileiros foram afundados ao longo das costas das Américas por submarinos Italianos, mas na sua maioria alemães. Entre eles estavam o: Buarque (14.02 ), Olinda (18.02), Cabedello (25.02), Arabutã (07.03), Cayru (08.03), Parnahyba (01.05), Gonçalves Dias (24.05), Alegrete (01.06), Pedrinhas (26.06), Tamandaré (26.07), Piave (28.07) e Barbacena (28.07), Antônico (28.09) e o Apalóide (22.11).
O torpedeamento
Em julho de 1942 o Alto Comando alemão emitiu ordens para que uma flotilha de submarinos seguisse para o Atlântico sul. Entre eles estava o U-185 um submarino tipo IXC comandado pelo do Capitão-de-Corveta August Maus.
Os navios brasileiros seguiam as regras impostas pelo Estado Maior da Marinha, onde se recomendava os comboios e caso não fosse possível, a rota deveria ser bem próximo da costa e apenas com as luzes de navegação acesas.
Muitos dos navios brasileiros até 1944 navegavam a escoteiro (sozinhos), já que as baixas velocidade e o excesso de fumaça deixava esses navios fora dos comboios protegidos e organizados pela Marinha americanas, que agora já operava em nosso litoral.
Nos dias 15, 16 e 17 de julho o U-507 atacou e afundou na costa de Sergipe e Bahia, os mercantes Baependy, Araraquara, Anibal Benévolo, Itagiba, Arará, e a barca Jacira, causando a morte de 551 brasileiros e perdas que totalizaram mais de 14.000 toneladas brutas.
A partir daí, as articulações políticas americanas, a pressão da imprensa e a reação popular que foi a rua pedir guerra, levaram o Presidente Getúlio Vargas, no dia 22 de agosto de 1942, a declarar guerra aos países do Eixo.
O Torpedeamento
O Brasil agora era um país em guerra, mas no início de 1943 as autoridades marítimas acreditavam que as medidas de proteção e a formação dos comboios resolveriam os problemas dos ataques dos U-Boats em nosso litoral. Até mesmo um aviso da Quarta esquadra americana de que “Nossa costa estava limpa” foi emitido.
Porém, isso não resolveu os problemas com os lentos e fumacentos navios da frota nacional, os capitães também não levaram em consideração que nos primeiros dias de março, quatro cargueiros estrangeiros (dois norte-americanos, um holandês e um sueco) foram atacados na mesma área.
O Bagé deixou o Rio de Janeiro no dia 11 de abril de 1943 em rota para portos no nordeste seguindo sem transcorrências até Recife.
No final de julho ele iniciou seu retorno partindo de Pernambuco para Bahia integrando o comboio (TJ-2 – Trinidad / Rio de Janeiro). O Capitão Artur Guimarães comandava uma tripulação de 108 homens.
Levava a bordo 30 passageiros e uma carga composta por 4.775 toneladas de borracha líquida em tonéis, castanha do Pará, couro, fibras, algodão, doces enlatados, e 10 tratores.
Do anúncio dos vapores do Lloyd Brasileiro iriam para o fundo o Affonso Penna (03.1943 – 2ª guerra), Annibal Benévolo (08.1942 – 2ª guerra), Miranda (04.1941 – encalhe no Espírito Santo), Lages (09.1942 2ª guerra), Ayuruoca (06.1945 – choque em Nova York), Siqueira Campos (08.1943 – encalhe no Ceará) e o Bagé (07.1943 – 2ª guerra)
Como outros navios brasileiros da época, era lento e soltava muita fumaça, assim, na tarde de 31 de julho, recebeu ordem do Comodoro para deixar o comboio e prosseguir sua viagem a escoteiro em uma rota mais próxima da costa.
Assim sendo, às 14 horas, o Capitão Artur Guimarães ordenou uma mudança de rumo para boreste, aproximando-se da costa e se afastando do comboio. Às 21:15 horas, quando estava a cerca de 30 milhas da costa entre Aracaju e Estância o submarino U-185 do capitão disparou um torpedo que atingiu o Bagé a meia nau por bombordo. A explosão abriu o um rombo no porão Nº 2, na carvoaria e no compartimento de caldeira, permitindo a entrada de uma grande quantidade de água. Rapidamente o Bagé começou a adernar e em menos de cinco minutos o vapor afundava. Os tripulantes e passageiros praticamente só tiveram tempo, de na noite escura, se jogar ao mar.
Na água, alguns náufragos conseguiram desvirar uma das baleeiras e passaram a recolher os sobreviventes. Depois que amanheceu e não localizavam mais vivos entre os destroços, seguiram em direção à costa.
Uma das baleeiras chegou à noite ao farol do Rio Real, outra, com 10 náufragos, dois deles com pernas quebradas, na praia de São Cristovão em Estância (SE.) e uma terceira, na localidade de Vila do Conde (BA).
Das 139 almas a bordo (30 passageiros e 108 tripulantes – mas existem números conflitantes) que se lançaram ao mar depois do ataque 105 foram salvos. Mas, 26 tripulantes e 8 passageiros perderam a vida, inclusive o capitão Artur Guimarães que foi visto por último, retornando a cabine comando para emitir um pedido S.O.S.
A velocidade e desespero dos eventos geraram muitas informações desencontradas. Segundo o imediato, “o Bagé foi torpedeado pelo menos duas vezes”. Outros passageiros declararam que houve apenas um torpedo, mas que o navio também foi canhonado, acertando-se a cabine do telegrafista, que impedir o pedido socorro e consequentemente passar a informação da localização do submarino, fato corroborado por testemunhas que afirmam que firam a luz do submarino na superfície (procedimento que já tinha sido testemunhado em outros ataques). Muitos tripulantes também afirmaram ter visto dois submarinos no local.
A guerra continuaria até 1945 e muitos outros torpedeamentos estavam por vir até o N. A Vital de Oliveira, da Marinha do Brasil ser torpedeado em 19.07.1944, no rio de Janeiro, sendo o último navio brasileiro atacado nas águas do nosso litoral.
Muitos anos depois… A foto da sala de máquinas do Bagé e seus tripulantes
Esta foto foi enviada a mim, através do site Naufrágios do Brasil em 2007 por uma pessoa da França. Segundo nos contou, ele era neto do chefe de máquinas do Bagé, que tinha uma família no Brasil e outra na França. Ele nos pedia ajuda para tentar localizar a família no Brasil que não conheciam.
Embora tenha achado a história fantasiosa e potencialmente problemática, entrei em contato com a Instituição Casa de Capitães da Marinha Mercante.
Me explicaram que era situação comum e que assumiriam o caso. Para ser sincero, não botei muita fé e relaxei…
Um mês depois, meu amigo francês entrou em contato novamente comigo agradecendo e avisando que já estava em contato com a família brasileira e um encontro com primos que iriam a França já estava agendado. Fiquei chocado!
Em agradecimento, além da foto ele me mandou uma belíssima coleção de livros dos naufrágios da França.
Que história difícil de acreditar… eu mesmo acho. Mas a foto do chefe de máquinas “bom de bico” e os livros estão aí para comprovar!Você gosta das histórias difíceis de acreditar? Então confira a carta na garrafa do Petrel.
A Marinha Mercante brasileira na Guerra
As perdas brasileiras da Marinha Mercante durante a Segunda Guerra Mundial foram enormes, considerando os parcos recursos que o país possuía no período.
35 navios foram torpedeados pelos submarinos italianos e alemães, causando a morte de 1.074 brasileiros, sendo 982 da Marinha Mercante e 474 na Marinha de Guerra.
Em honra das vítimas desse conflito foi erguido no Rio de Janeiro o Monumento dos Pracinhas, onde existem as sepulturas e nomes dessas perdas.